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terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Rindo de quê?


Rui Daher
De São Paulo (SP) para Terra Magazine


Os sorrisos, na foto de Masy Andriantsoa que ilustra a coluna, contagiam. São de colhedores de arroz na costa leste de Madagascar. No texto não mostrarei tanta alegria.

Segundo o Population Reference Bureau, em 2011, o planeta terá sete bilhões de humanos. Quase 15% deles continuarão passando fome, afirma a FAO, braço da ONU para as agricultura e alimentação.

Em outubro, a mesma ONU, feliz, declarava que pela primeira vez em 15 anos o número de famintos havia caído 100 milhões. Pouca glória, se considerarmos que, entre 2007 e 2009, o grupo havia aumentado em 170 milhões e que a comemorada queda foi sobre um período de forte crise mundial e de preços dos alimentos na estratosfera.

Confesso ter dificuldade para entender como se fica sabendo que pessoas entram e saem da fome de um ano para outro a ponto de serem contabilizadas. Mas, como os dados vêm de organizações sérias, não creio ser o caso de repetir os versos de um samba-canção composto, em 1934, por Noel Rosa e Vadico: "Pra quê mentir se tu ainda não tens/Esse dom de saber iludir?".

O fato é que faz tempo que convivemos com índices entre 13 e 15% de famintos em torno de nós. Sobretudo, quem habita regiões africanas, asiáticas e sul e centro-americanas.

O Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (IFAD, na sigla em inglês), agência da ONU com a missão de "capacitar populações rurais pobres a superarem a pobreza", acaba de divulgar seu "Relatório da Pobreza Rural, 2011".

É brava a situação, meus caros. São considerados pobres os que vivem com US$ 1,25 por dia. Pois bem, 75% deles estão em áreas rurais. Cerca de um bilhão de crianças, mulheres e homens.

E quantos serão eles, em 2050, quando a população mundial alcançar nove bilhões? Ainda que a produção de alimentos consiga crescer 70% para atender a demanda projetada, resguardado pelo IFAD e pelo meu ceticismo com a brevidade de mudanças sociais na agricultura, sinto responder: 1,5 bilhão de pessoas, pelo menos.

O Relatório - um dos melhores estudos recentes sobre agricultura e pobreza disponível - parte do consenso de que essa atividade é a mais capacitada a reduzir a miséria nessas regiões. E foca duas áreas: os pequenos proprietários (smallholders) e a economia rural não-agrícola. Uma tese que simpatizantes do "Brasil Potência Agrícola" relutam em comprar.

E como progredir nisso?

Primeiro, eliminando os riscos inerentes à atividade. Garantindo apoio tecnológico e financeiro para a produtividade em qualquer situação climática, e mercado a preços que permitam a continuidade da produção e a estabilidade econômica dos que vivem dela. Uma cadeia em que os elos essenciais são: produção primária, agroindústria e serviços.

Segundo, assegurando-lhes infraestrutura local, aparelhos educacionais e de saúde, apoio comunitário.

O IFAD alerta para um quadro de dramática mudança. Até recentemente, a produção mundial de alimentos cresceu acima da taxa de aumento populacional, baseada nas expansões de terras e de tecnologias para a alta produtividade, o que resultou preços mais acessíveis.

Hoje, e o que é previsto continuar no futuro, a incorporação de grandes massas consumidoras em países emergentes, o espaço ocupado pelo aumento do uso de biocombustíveis e a conscientização quanto à preservação ambiental, fazem ver que a intensificação da produção agropecuária a preços baixos não permite o uso do mesmo modelo.

A produção e o mercado agropecuários, para extinguir a pobreza e a fome no mundo, fatalmente, precisarão atender preceitos de sustentabilidade social e ambiental.

Volto ao assunto na próxima semana.

Rui Daher é administrador de empresas, consultor da Biocampo Desenvolvimento Agrícola.

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