Mais de 100 anos depois da abolição da escravatura, os quilombos ainda são uma realidade. Na Bahia, por exemplo, existem 808 comunidades quilombolas, das quais 206 já estão certificadas pela Fundação Palmares. Um dos destaques é o Campo Grande, no município de Santa Terezinha, Território Piemonte do Paraguaçu, que possui 240 famílias de descendentes de escravos, que ainda tem a agricultura como atividade principal.
Dentro dessa vertente, a Secretaria da Agricultura (Seagri), por intermédio da Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola (EBDA), órgão responsável pela assistência técnica e extensão rural no estado, vem intensificando suas ações junto aos quilombolas da Bahia. “A missão da EBDA é promover o acesso à assistência técnica, juntamente com a comunidade, utilizando o modelo agroecológico, com o principio da economia solidária, garantindo a qualidade de alimentos e a melhoria de vida das pessoas. Isso resulta em autonomia sóciopolítica, econômica, cultural, ambiental e alimentar”, explica o presidente da empresa, Emerson Leal.
De acordo com a técnica da EBDA no município de Castro Alves e responsável pelas comunidades quilombolas da região, Lucinete Amara, o maior objetivo a ser alcançado é o desenvolvimento rural sustentável, respeitando os princípios e as diretrizes culturais de cada comunidade quilombola.
Este ano, o foco da empresa está voltado para otimizar o acesso dos agricultores familiares junto às linhas de crédito rural, dentre eles, os quilombolas. Para isso, intensificou suas atividades de emissão de Declarações de Aptidão (DAP). O documento é o instrumento que identifica o agricultor familiar como beneficiário do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e é obrigatório para acessar créditos e programas sociais.
“A DAP é o passaporte que dá ao agricultor acesso aos programas sociais dos governos do Estado e federal, às linhas de crédito como o Pronaf A ou B, ao Programa Mais Alimentos, e também garante o direito à assistência técnica e à tecnologia. Portanto, é essencial que os quilombolas façam parte das políticas públicas do estado. Das 240 famílias de Campo Grande, mais da metade já está apta a receber os benefícios dos programas e a meta é inserir 100% dos quilombolas nos programas sociais”, diz Lucinete.
Além disso, a EBDA tem realizado periodicamente capacitações, com a realização do Dias de Campo, palestras, seminários e cursos. O intuito é implantar projetos produtivos comunitários como casa do mel, casa de farinha, hortas, pomares, criação de pequenos animais (galinha-caipira, suínos, caprinos e ovinos, peixes e abelhas) e artesanato.
Ações e resultados
De acordo com a presidente da Associação dos Quilombolas de Campo Grande, Marilene dos Santos, após os cursos de pintura em tecidos e artesanato com palhas oferecidos pela EBDA, as mulheres da comunidade aprenderam a produzir tapetes, bolsas, chapéus, bocapius, que são comercializados nas feiras livres da região.
“Nossas bolsas já são comercializadas entre R$ 15 e R$ 35. Estamos muito empolgadas com as vendas. O curso nos proporcionou mais uma fonte de renda, com a venda das toalhas de prato e bolsas. A meta agora é produzir mais para as festas de fim de ano”, afirma quilombola. O curso de pintura acontecia duas vezes, por semana, para cerca de 20 pessoas, que aprendiam a pintar em toalhas e pano de prato.
Outra ação exitosa é a do apicultor Genivaldo da Silva, mais conhecido na comunidade como ‘Mil’, que participou dos cursos de apicultura e resolveu investir na produção do mel. “Comecei trocando alguns animais (galinhas-caipiras e patos) por caixas de armazenamento de mel. O sucesso foi total. Gostei, e agora só me dedico à produção de mel, já tendo 20 caixas que cabem 120 litros de mel e vendo de R$10 a R$15, o litro. Tenho comprador até de São Paulo e Brasília”.
A EBDA, além dos quilombolas, tem orientado e capacitado estudantes dos ensinos médio e fundamental e interessados em apicultura, meliponicultura, georreferenciamento, manejo avançado para produção do mel, orientações para apicultores e familiares em saúde preventiva e segurança do trabalho, cooperativismo, associativismo e resgate da cultura da abelha nativa sem ferrão, que está em extinção. Estes são alguns dos temas dos seminários, minicursos e palestras disponibilizados, gratuitamente, aos apicultores.
Expectativas
Segundo o diretor de Pecuária da EBDA, Elionaldo Teles, a empresa pretende capacitar todas as comunidades quilombolas da Bahia, pois o sentido é contribuir para o desenvolvimento sóciopolítico e a consciência ambiental das áreas de quilombos. Isso para buscar a identidade e a inclusão social como forma de garantir a sustentabilidade, que há séculos foi negada, resultante da exclusão social escravocrata. “Nossa intenção é oferecer instrumentos que permitam utilizar os recursos naturais de forma equilibrada, em sintonia com a agroecologia”.
O projeto junto aos quilombolas quer elevar a consciência social e possibilitar a participação efetiva dos agricultores nas discussões dos seus direitos enquanto cidadãos. Além disso, também fornecer tecnologias desenvolvidas para atender às necessidades do produtor rural.
Fonte: www.jornalgrandebahia.com.br
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