sexta-feira, 26 de novembro de 2010
Da indústria da seca à indústria das consultorias
Edmilson Lopes Júnior
De Natal (RN) para Terra Magazine
O livro "Elegia para uma re(li)gião", publicado há quase 4 décadas, é um dos clássicos das ciências sociais brasileiras. Nele, com rigor analítico e uma apreensão crítica, mas não desapaixonada do entorno social sobre o qual se debruçou, o sociólogo Francisco de Oliveira explicitou os interesses, disputas, traições e sonhos que estiveram na base da criação e do funcionamento da SUDENE nos seus primeiros anos. Nessa obra, de leitura ainda obrigatória para todos quantos queiram pensar os desafios da desigualdade no Brasil, Oliveira conseguiu deslindar os interesses de classes subjacentes ao projeto de desenvolvimento regional do Nordeste do Brasil. Esboçou ainda uma análise sofisticada a respeito dos limites do planejamento no Brasil. Embora não tenha sido esse o centro do seu projeto de investigação sociológica, o reconhecido sociólogo apontou as diversas formas de "captura dos aparatos locais do Estado" pelas longevas oligarquias políticas da região. Dentre estas, a agora folclórica indústria da seca.
A famigerada "indústria da seca" fornecia, ainda na década de 1970, quando Oliveira escreveu a sua obra, referentes empíricos para a sua análise daquela "captura". De fato, as oligarquias locais ainda reproduziam o seu mando a partir do controle dos recursos destinados aos "nordestinos pobres". Não por acaso, todo um período histórico, com marco inicial nas primeiras décadas do século XX, correspondeu ai apogeu do discurso regionalista, tanto na vida política quanto na produção cultural. Essa produção cumpria o importante papel de justificar o aporte de recursos públicos para as "frentes de serviço" e para as "obras contra as secas" na região. Esses recursos cevaram as elites locais, indica-nos hoje uma já farta literatura nos campos da sociologia, da história e da geografia.
Oliveira não se prendeu ao superficial, e ao que, já então, era folclórico. Viu além. Percebeu formas híbridas, de moderno e arcaico, na promiscuidade entre as elites locais e o Estado. Não por acaso, mirou sua bateria analítico nos fundos públicos mobilizados para a industrialização regional. E percebeu, antes de todo, a insustentabilidade do ciclo de industrialização regional induzida pela SUDENE.
Quatro décadas depois, após anos de crescimento regional acima da média nacional, o que ainda há de muito atual na análise de Oliveira é a eterna apropriação dos fundos públicos pelas elites regionais. Agora, em uma dinâmica modelada pelos ritmos frenéticos da financeirização da vida econômica. A incorporação de faixas do litoral da região à dinâmica da incorporação imobiliária internacional é um exemplo do "novo", que sempre é invólucro do muito antigo nas partes setentrionais do Brasil. O Estado, obviamente, continua presente, subsidiando, direta ou indiretamente, os empreendimentos agora geridos pelos (ou em parceria com) descendentes dos oligarcas de ontem.
A urbanização turística das capitais nordestinas é a face luminosa de um processo que tem o seu lado pouco claro. As torres, condomínios luxuosos e empreendimentos comerciais gigantescos com a durabilidade de um verão, que agora modulam as faces das principais cidades da região, são os símbolos dessa nova dinâmica econômica. Nessas paisagens, atores de ontem e de hoje traçam, lépidos e fagueiros, alianças sorrateiras. Dentre os novos atores, piratas da indústria imobiliária internacional e, como suspeitam não poucas autoridades policiais, organizações criminosas internacionais. Não por acaso, em muitas das recentes operações da Polícia Federal na região, investidores internacionais são desmascarados como atores do crime organizado internacional.
Mas a captura do Estado não ocorre apenas com o subsídio dos "fundos públicos" às novas atividades relacionadas ao turismo. Outras formas, menos sofisticadas, mas igualmente modernosas têm crescido exponencialmente. Refiro-me, em especial, à indústria das consultorias. Relatórios dos gastos públicos de governos e prefeituras da região apontam o peso do pagamento de consultorias nas despesas públicas dos últimos anos. Os resultados dessas consultorias, muitas delas justificadas com palavrório rebuscado, são, para dizer o mínimo, controversos. Trata-se, isso sim, de uma competente drenagem de dinheiro público para cevar, como antes ocorria com a "indústria da seca", a reprodução das elites locais.
Agora, ao invés do açude ou poço do DNOCS na fazenda do dono do poder, temos consultorias realizadas por sócios ou aliados dos potentados de sempre. Com a importante diferença de que, agora, tudo ocorre de forma impecavelmente asséptica. A nova captura do Estado, como sói ocorrer quase sempre nos dias de hoje, assume contornos flexíveis. Empresas virtuais, que contratam terceiras e, último elo da cadeia, um funcionário público que, por um pouco mais ou quase nada, faz o serviço todo de fornecer os dados para, por exemplo, um "profundo diagnóstico" do órgão no qual trabalha. Tudo é muito virtual. Escritórios, consultores e produtos existem virtualmente. Apenas os recursos públicos abiscoitadas é que ganham materialidade. Não raramente, em imóveis e automóveis de luxo.
Embora seja desnecessário, é bom afirmar, para evitar mal-entendidos, que não se está aqui a condenar, de forma ampla e geral, o trabalho de consultorias para os órgãos estatais. Longe disso! Tarefas importantes são assumidas, com competência e honestidade, por muitos consultores em muitas partes do Nordeste e do país. Via de regra, esses consultores ganham pouco, muito pouco. E, geralmente, recebem com atraso os seus devidos pagamentos.
Edmilson Lopes Júnior é professor de sociologia na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
De Natal (RN) para Terra Magazine
O livro "Elegia para uma re(li)gião", publicado há quase 4 décadas, é um dos clássicos das ciências sociais brasileiras. Nele, com rigor analítico e uma apreensão crítica, mas não desapaixonada do entorno social sobre o qual se debruçou, o sociólogo Francisco de Oliveira explicitou os interesses, disputas, traições e sonhos que estiveram na base da criação e do funcionamento da SUDENE nos seus primeiros anos. Nessa obra, de leitura ainda obrigatória para todos quantos queiram pensar os desafios da desigualdade no Brasil, Oliveira conseguiu deslindar os interesses de classes subjacentes ao projeto de desenvolvimento regional do Nordeste do Brasil. Esboçou ainda uma análise sofisticada a respeito dos limites do planejamento no Brasil. Embora não tenha sido esse o centro do seu projeto de investigação sociológica, o reconhecido sociólogo apontou as diversas formas de "captura dos aparatos locais do Estado" pelas longevas oligarquias políticas da região. Dentre estas, a agora folclórica indústria da seca.
A famigerada "indústria da seca" fornecia, ainda na década de 1970, quando Oliveira escreveu a sua obra, referentes empíricos para a sua análise daquela "captura". De fato, as oligarquias locais ainda reproduziam o seu mando a partir do controle dos recursos destinados aos "nordestinos pobres". Não por acaso, todo um período histórico, com marco inicial nas primeiras décadas do século XX, correspondeu ai apogeu do discurso regionalista, tanto na vida política quanto na produção cultural. Essa produção cumpria o importante papel de justificar o aporte de recursos públicos para as "frentes de serviço" e para as "obras contra as secas" na região. Esses recursos cevaram as elites locais, indica-nos hoje uma já farta literatura nos campos da sociologia, da história e da geografia.
Oliveira não se prendeu ao superficial, e ao que, já então, era folclórico. Viu além. Percebeu formas híbridas, de moderno e arcaico, na promiscuidade entre as elites locais e o Estado. Não por acaso, mirou sua bateria analítico nos fundos públicos mobilizados para a industrialização regional. E percebeu, antes de todo, a insustentabilidade do ciclo de industrialização regional induzida pela SUDENE.
Quatro décadas depois, após anos de crescimento regional acima da média nacional, o que ainda há de muito atual na análise de Oliveira é a eterna apropriação dos fundos públicos pelas elites regionais. Agora, em uma dinâmica modelada pelos ritmos frenéticos da financeirização da vida econômica. A incorporação de faixas do litoral da região à dinâmica da incorporação imobiliária internacional é um exemplo do "novo", que sempre é invólucro do muito antigo nas partes setentrionais do Brasil. O Estado, obviamente, continua presente, subsidiando, direta ou indiretamente, os empreendimentos agora geridos pelos (ou em parceria com) descendentes dos oligarcas de ontem.
A urbanização turística das capitais nordestinas é a face luminosa de um processo que tem o seu lado pouco claro. As torres, condomínios luxuosos e empreendimentos comerciais gigantescos com a durabilidade de um verão, que agora modulam as faces das principais cidades da região, são os símbolos dessa nova dinâmica econômica. Nessas paisagens, atores de ontem e de hoje traçam, lépidos e fagueiros, alianças sorrateiras. Dentre os novos atores, piratas da indústria imobiliária internacional e, como suspeitam não poucas autoridades policiais, organizações criminosas internacionais. Não por acaso, em muitas das recentes operações da Polícia Federal na região, investidores internacionais são desmascarados como atores do crime organizado internacional.
Mas a captura do Estado não ocorre apenas com o subsídio dos "fundos públicos" às novas atividades relacionadas ao turismo. Outras formas, menos sofisticadas, mas igualmente modernosas têm crescido exponencialmente. Refiro-me, em especial, à indústria das consultorias. Relatórios dos gastos públicos de governos e prefeituras da região apontam o peso do pagamento de consultorias nas despesas públicas dos últimos anos. Os resultados dessas consultorias, muitas delas justificadas com palavrório rebuscado, são, para dizer o mínimo, controversos. Trata-se, isso sim, de uma competente drenagem de dinheiro público para cevar, como antes ocorria com a "indústria da seca", a reprodução das elites locais.
Agora, ao invés do açude ou poço do DNOCS na fazenda do dono do poder, temos consultorias realizadas por sócios ou aliados dos potentados de sempre. Com a importante diferença de que, agora, tudo ocorre de forma impecavelmente asséptica. A nova captura do Estado, como sói ocorrer quase sempre nos dias de hoje, assume contornos flexíveis. Empresas virtuais, que contratam terceiras e, último elo da cadeia, um funcionário público que, por um pouco mais ou quase nada, faz o serviço todo de fornecer os dados para, por exemplo, um "profundo diagnóstico" do órgão no qual trabalha. Tudo é muito virtual. Escritórios, consultores e produtos existem virtualmente. Apenas os recursos públicos abiscoitadas é que ganham materialidade. Não raramente, em imóveis e automóveis de luxo.
Embora seja desnecessário, é bom afirmar, para evitar mal-entendidos, que não se está aqui a condenar, de forma ampla e geral, o trabalho de consultorias para os órgãos estatais. Longe disso! Tarefas importantes são assumidas, com competência e honestidade, por muitos consultores em muitas partes do Nordeste e do país. Via de regra, esses consultores ganham pouco, muito pouco. E, geralmente, recebem com atraso os seus devidos pagamentos.
Edmilson Lopes Júnior é professor de sociologia na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Mais de 11 milhões de brasileiros passaram fome em 2009
Do UOL Ciência e Saúde
Aproximadamente 30% dos domicílios brasileiros não têm acesso regular e permanente a alimentos de qualidade e em quantidade suficiente. É o que mostra levantamento suplementar da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) divulgado nesta sexta-feira (26) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A pesquisa, relativa a 2009, analisou 58,6 milhões de domicílios particulares no país. Desse total, 17,7 milhões (30,2%) apresentam algum grau de insegurança alimentar, o que representa um total de 65,6 milhões de pessoas. Em 2004, a proporção era de 34,9%.
Entre esses domicílios mencionados acima, 18,7% (ou 11 milhões de lares) apresentam situação de insegurança alimentar leve; 6,5% (3,8 milhões) moderada, e 5% (2,9 milhões) grave. Ao todo, 11,2 milhões de pessoas relataram ter passado fome no período investigado.
Em 2004, as prevalências de domicílios com moradores em situação de insegurança alimentar leve, moderada e grave eram, respectivamente, 18%, 9,9% e 7%. Ou seja, houve redução dos percentuais de restrição moderada e grave.
A pesquisa mostra que a prevalência de insegurança alimentar é maior na área rural do que na urbana. Enquanto 6,2% e 4,6% dos domicílios em área urbana apresentavam níveis moderado e grave, respectivamente, na área rural as proporções foram de 8,6% e 7%.
Regiões
O levantamento mostra que a Região Sul é a que apresenta menos problemas. Santa Catarina é a unidade da Federação com maior percentual (85,2%) de domicílios em situação de segurança alimentar, seguida do Rio Grande do Sul (80,8%) e do Paraná (79,6%). A média nacional é de 69,8%.
Já nas regiões Norte e Nordeste, todos os Estados apresentam proporções inferiores à média nacional de segurança alimentar. No Maranhão (35,4%) e no Piauí (41,4%), nem metade dos domicílios conta com alimentação saudável e em quantidade suficiente assegurada. No Centro-Oeste, apenas Goiás está nessas condições.
Perfil dos domicílios
Além de menos bens, os domicílios em situação de insegurança alimentar também são os menos atendidos pela rede coletora de esgoto sanitário. Outra característica é a maior densidade por dormitório: em 4,5% dos domicílios com restrições alimentares graves há três ou mais moradores dormindo no mesmo quarto.
Cerca de 55% dos domicílios em situação de insegurança alimentar moderada ou grave têm renda mensal domiciliar per capita de até meio salário mínimo.
A prevalência de restrições é maior em domicílios em que residem crianças. A pesquisa indica que 8,1% da população de 0 a 17 anos vivem em situação de insegurança alimentar grave. Na faixa etária de 65 anos ou mais, a proporção é de 3,6%.
Do total de 97,8 milhões de moradores pretos ou pardos, 43,4% apresentam algum nível de insegurança alimentar. Entre os brancos (92,4 milhões), a prevalência é de 24,6%.
Em relação à escolaridade, a pesquisa mostra que quanto maior o grau de instrução, menor a prevalência de insegurança alimentar grave ou moderada. Em 2004, 29,2% dos moradores sem instrução ou com menos de um ano estudo apresentavam restrição na quantidade de alimentos moderada ou grave. Em 2009, a proporção caiu para 20,2%.
Aproximadamente 30% dos domicílios brasileiros não têm acesso regular e permanente a alimentos de qualidade e em quantidade suficiente. É o que mostra levantamento suplementar da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) divulgado nesta sexta-feira (26) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A pesquisa, relativa a 2009, analisou 58,6 milhões de domicílios particulares no país. Desse total, 17,7 milhões (30,2%) apresentam algum grau de insegurança alimentar, o que representa um total de 65,6 milhões de pessoas. Em 2004, a proporção era de 34,9%.
Entre esses domicílios mencionados acima, 18,7% (ou 11 milhões de lares) apresentam situação de insegurança alimentar leve; 6,5% (3,8 milhões) moderada, e 5% (2,9 milhões) grave. Ao todo, 11,2 milhões de pessoas relataram ter passado fome no período investigado.
Em 2004, as prevalências de domicílios com moradores em situação de insegurança alimentar leve, moderada e grave eram, respectivamente, 18%, 9,9% e 7%. Ou seja, houve redução dos percentuais de restrição moderada e grave.
A pesquisa mostra que a prevalência de insegurança alimentar é maior na área rural do que na urbana. Enquanto 6,2% e 4,6% dos domicílios em área urbana apresentavam níveis moderado e grave, respectivamente, na área rural as proporções foram de 8,6% e 7%.
Regiões
O levantamento mostra que a Região Sul é a que apresenta menos problemas. Santa Catarina é a unidade da Federação com maior percentual (85,2%) de domicílios em situação de segurança alimentar, seguida do Rio Grande do Sul (80,8%) e do Paraná (79,6%). A média nacional é de 69,8%.
Já nas regiões Norte e Nordeste, todos os Estados apresentam proporções inferiores à média nacional de segurança alimentar. No Maranhão (35,4%) e no Piauí (41,4%), nem metade dos domicílios conta com alimentação saudável e em quantidade suficiente assegurada. No Centro-Oeste, apenas Goiás está nessas condições.
Perfil dos domicílios
Além de menos bens, os domicílios em situação de insegurança alimentar também são os menos atendidos pela rede coletora de esgoto sanitário. Outra característica é a maior densidade por dormitório: em 4,5% dos domicílios com restrições alimentares graves há três ou mais moradores dormindo no mesmo quarto.
Cerca de 55% dos domicílios em situação de insegurança alimentar moderada ou grave têm renda mensal domiciliar per capita de até meio salário mínimo.
A prevalência de restrições é maior em domicílios em que residem crianças. A pesquisa indica que 8,1% da população de 0 a 17 anos vivem em situação de insegurança alimentar grave. Na faixa etária de 65 anos ou mais, a proporção é de 3,6%.
Do total de 97,8 milhões de moradores pretos ou pardos, 43,4% apresentam algum nível de insegurança alimentar. Entre os brancos (92,4 milhões), a prevalência é de 24,6%.
Em relação à escolaridade, a pesquisa mostra que quanto maior o grau de instrução, menor a prevalência de insegurança alimentar grave ou moderada. Em 2004, 29,2% dos moradores sem instrução ou com menos de um ano estudo apresentavam restrição na quantidade de alimentos moderada ou grave. Em 2009, a proporção caiu para 20,2%.
Cotados para assumir o Incra e MDA têm perfis parecidos com atuais gestores
Representantes de grupos de sem-terra e da agricultura familiar pressionam por mudanças na condução da política agrária da presidente eleita, Dilma Rousseff, e cobram um choque no setor. A previsão, no entanto, é de não haver nenhuma ruptura no modelo de funcionamento do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Os cotados para assumir os cargos são alinhados com as atuais gestões.
Para o ministério, os nomes mais fortes são o de Joaquim Soriano, coordenador do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural da pasta, e do deputado estadual do Rio Grande do Sul Elvino Bohn Gass (PT). No Incra, a mudança parece estar resolvida. Deve assumir, no lugar de Rolf Hackbart, o diretor de Gestão Estratégica do instituto, Roberto Kiel.
A diretora de Meio Ambiente da Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (Fetraf), Maria da Graça Amorim, disse que a política agrária do presidente Lula está estagnada e com dificuldade de acesso a crédito por parte de assentados. “O problema da reforma agrária não é de recursos. O problema é que o dinheiro está sendo mal aplicado”, afirmou Maria da Graça.
Para ela, não adianta apenas mudar os nomes dos cabeças do instituto e do ministério. É preciso mudar o perfil da gestão. “Não adiantar trocar as pessoas e deixar tudo como está. É preciso trocar os superintendentes do Incra. Tem muito assentamento que não recebe crédito há três, quatro anos”, disse a dirigente da Fetraf.
Conab
Os sindicalistas e os grupos de sem-terra defendem ainda um fortalecimento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). A demanda é garantir que a estatal tenha planos melhores de compra de alimentos de produtores familiares. Além da Conab, o Ministério de Desenvolvimento Social tem programa de compra de produtos colhidos por pequenos agricultores. A grande reclamação é que o governo dá terra aos assentados, porém não garante o desenvolvimento das propriedades.
Durante a campanha, Dilma evitou comprometer-se com pontos polêmicos defendidos pelos agricultores familiares, como a revisão dos índices de produtividade e a revogação de medidas que criminalizam invasão de terra. Outra cobrança é pela retomada das metas de famílias assentadas por ano. No começo do governo, Lula estabeleceu o objetivo de dar terra para 115 mil famílias anualmente. Com os seguidos descumprimentos, a meta acabou extinta.
Afago de Stédile
Apesar de não indicar com uma mudança na condução da política agrária, a presidente eleita, Dilma Rousseff, recebeu recentemente um afago de João Pedro Stédile, dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Segundo ele, as forças que elegeram a petista têm mais chance de avançar na reforma agrária do que foi feito pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Para o ministério, os nomes mais fortes são o de Joaquim Soriano, coordenador do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural da pasta, e do deputado estadual do Rio Grande do Sul Elvino Bohn Gass (PT). No Incra, a mudança parece estar resolvida. Deve assumir, no lugar de Rolf Hackbart, o diretor de Gestão Estratégica do instituto, Roberto Kiel.
A diretora de Meio Ambiente da Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (Fetraf), Maria da Graça Amorim, disse que a política agrária do presidente Lula está estagnada e com dificuldade de acesso a crédito por parte de assentados. “O problema da reforma agrária não é de recursos. O problema é que o dinheiro está sendo mal aplicado”, afirmou Maria da Graça.
Para ela, não adianta apenas mudar os nomes dos cabeças do instituto e do ministério. É preciso mudar o perfil da gestão. “Não adiantar trocar as pessoas e deixar tudo como está. É preciso trocar os superintendentes do Incra. Tem muito assentamento que não recebe crédito há três, quatro anos”, disse a dirigente da Fetraf.
Conab
Os sindicalistas e os grupos de sem-terra defendem ainda um fortalecimento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). A demanda é garantir que a estatal tenha planos melhores de compra de alimentos de produtores familiares. Além da Conab, o Ministério de Desenvolvimento Social tem programa de compra de produtos colhidos por pequenos agricultores. A grande reclamação é que o governo dá terra aos assentados, porém não garante o desenvolvimento das propriedades.
Durante a campanha, Dilma evitou comprometer-se com pontos polêmicos defendidos pelos agricultores familiares, como a revisão dos índices de produtividade e a revogação de medidas que criminalizam invasão de terra. Outra cobrança é pela retomada das metas de famílias assentadas por ano. No começo do governo, Lula estabeleceu o objetivo de dar terra para 115 mil famílias anualmente. Com os seguidos descumprimentos, a meta acabou extinta.
Afago de Stédile
Apesar de não indicar com uma mudança na condução da política agrária, a presidente eleita, Dilma Rousseff, recebeu recentemente um afago de João Pedro Stédile, dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Segundo ele, as forças que elegeram a petista têm mais chance de avançar na reforma agrária do que foi feito pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
Capital estrangeiro avança sobre produção de frutas
Do Valor Econômico
O agronegócio tem despertado interesse de investidores de China, Coreia do Sul, Indonésia e Índia, países com os quais o Ministério da Agricultura tem fóruns de negócios em andamento.
Biodiesel é o que atrai o grupo indiano Shree Remuka Sugars Ltd., um dos maiores do setor sucroenergético, que formou uma joint venture para a produção de açúcar e etanol - a Usina Revati, no interior de São Paulo -, com investimento previsto de R$ 226 milhões. Ele já é dono da Vale do Ivaí Açúcar e Álcool, no Paraná.
Setores do Poder Judiciário atrasam desapropriações
Por Vanessa Ramos
Da Página do MST
Um balanço sobre a eficácia do Incra durante o governo Lula demonstra a existência de mais de 200 processos de desapropriação suspensos por juízes.
Leia a íntegra da entrevista com Valdez Adriani Farias, procurador federal do Incra de Santa Catarina, sobre a atuação do instituto.
Você acha que os instrumentos legais do Incra são eficientes?
Os instrumentos postos à disposição do Incra podem ser mais eficientes. Alguns precisam ser reformulados, outros melhor compreendidos ou potencializados. Refiro-me aos instrumentos para aquisição de terras, os quais são fundamentais para uma efetiva democratização do acesso à terra.
Por exemplo, um dos instrumentos é a aquisição de imóveis pela modalidade compra e venda, a qual vem sendo pouco utilizada porque a forma de pagamento se dá em condições e prazos parecidos com a desapropriação-sanção e que não são bem aceitos pelo mercado imobiliário.
Então, sendo a compra um ato que depende da concordância do vendedor, poucos proprietários concordam em vender os imóveis nas condições e prazos previstos no Dec. 433/92.
Esse instrumento, que é complementar à desapropriação, poderia ser potencializado com uma reformulação no sentido de prever prazos e condições condizentes como mercado de terras.
Quais são as vantagens desse instrumento?
Primeira: o Incra utilizaria o instrumento somente para comprar terras de qualidade e localizadas próximas dos grandes centros ou com fácil escoamento da produção.
Segunda: evita-se a judicialização, pois a compra e venda é encerrada com uma escritura pública. Terceira: evita-se o pagamento dos pesados juros compensatórios e moratórios que incidem nos processos judiciais de desapropriação.
Mas repito, esse instrumento é complementar à desapropriação e não pode substituí-la.
A desapropriação-sanção deve ser o principal instrumento do Incra para aquisição de imóveis. Mas a eficiência desse instrumento depende da atualização dos índices de produtividade, que como sabemos estão muito defasados, pois baseados no Censo Agropecuário de 1975.
Por que o Poder Judiciário atrasa os processos de desapropriação?
A eficiência do instrumento da desapropriação-sanção depende de uma mudança de entendimento que predomina no âmbito do Judiciário. Veja que em função da importância e da urgência da Reforma Agrária, o Constituinte dispôs que o processo de desapropriação teria rito sumário.
Passada meia década a Lei Complementar 76/93 regulou este dispositivo, e no seu artigo 18 dispôs que o processo judicial de desapropriação por interesse social para fins de Reforma Agrária tem caráter preferencial e prejudicial em relação a outros processos que envolvam o imóvel.
A Constituição é clara, a lei é claríssima, mas a maioria esmagadora dos juízes que possuem visão eminentemente civilista continua suspendendo os processos de desapropriação em clara afronta à Constituição e à Lei Complementar.
Que problemas burocráticos o Incra precisa resolver?
Problemas burocráticos existem, mas estes podem ser resolvidos com gestão. Penso que o problema está num outro patamar. É que a efetiva implementação da Reforma Agrária por certo é de responsabilidade dos três Poderes da República. Não depende somente do Executivo.
Veja o processo de desapropriação quase sempre é judicializado, e a efetiva destinação da área para Reforma Agrária depende do judiciário. É preciso que o judiciário aplique a Constituição e a Lei Complementar que dispõe que o processo de desapropriação deve obedecer rito sumário e deve ter trâmite preferencial.
Não é possível que um processo que encerra uma urgência e tem em vista o atendimento de um interesse social já declarado pelo Presidente da República fique no aguardo do desfecho de uma ação declaratória de produtividade ajuizada pelo proprietário do imóvel.
Insisto nesse ponto, pois segundo levantamento realizado pela Procuradoria do Incra, existiam mais de 200 processos de desapropriação suspensos em face desse entendimento que simplesmente desconsidera a previsão constitucional e legal.
O Poder Legislativo, por sua vez, não tem atuado para aperfeiçoar o ordenamento no tocante a Reforma Agrária. Exemplo disso é a PEC 438/2001, que prevê a expropriação dos imóveis com trabalho escravo, a qual está parada na Câmara desde 2004, e, portanto, já tramita no parlamento há quase uma década. Se não bastasse essa inércia as investidas do legislativo por meio de CPI´s são na linha da criminalização dos movimentos sociais que lutam pela terra, o que é lamentável.
Como solucionar as falhas do Incra?
Eventuais falhas administrativas podem ser corrigidas com um processo contínuo de melhoria na gestão. A melhora do desempenho da autarquia no tocante à intervenção fundiária depende dentre outros aspectos da realização de algumas alterações legislativas. Algumas alterações podem ser realizadas através de decreto, e, portanto, estão no âmbito de competência do Executivo, outras já dependem do Legislativo.
Como você avalia as condições de trabalho dos servidores do Incra?
As condições de trabalho melhoraram consideravelmente no governo Lula. A autarquia passou por um processo de fortalecimento. O orçamento destinado ao Incra aumentou expressivamente. Novos concursos foram realizados. Na questão salarial, apesar de alguns avanços, o certo é que ainda existe um déficit em relação a outras carreiras do serviço público federal. Esta é uma questão importante que deve ser corrigida e resolvida para evitar que as carreiras do Incra sejam esvaziadas com a perda de profissionais muito qualificados.
Como você analisa as experiências de Reforma Agrária durante o governo Lula?
Temos convicção que avançamos, mas não com a intensidade e com a qualidade que queríamos. Um aspecto positivo que diferencia o governo Lula é no tocante ao reconhecimento dos movimentos sociais enquanto interlocutores dos trabalhadores rurais organizados.
A questão da terra foi vista como um problema social que deve ser resolvido, não como caso de polícia. Pelo menos no âmbito do Poder Executivo, não se criminalizou os movimentos sociais. Essa compreensão que tem clareza do papel do movimento social é importante ponto de partida para chegarmos a bom termo e soluções efetivas.
Na área jurídica, pode se dizer que avançamos em alguns aspectos que reputo importantes, como a questão da função social da propriedade. Desde o lançamento do 2º Plano Nacional de Reforma Agrária passamos a resgatar o conceito constitucional de função social da propriedade. Passamos a defender a necessidade de dar efetividade ao art. 186 da Constituição em toda a sua plenitude.
Assim, o alvo da Reforma Agrária passou a ser não só o imóvel improdutivo, mas também aquele que seu proprietário descumpre as leis trabalhistas, ambientais e de bem-estar.
O Incra vem sendo orientado para proceder a fiscalização de todos estes aspectos. Até então, a função social era reduzida apenas ao aspecto econômico, de forma que o imóvel considerado produtivo ficava imune à desapropriação-sanção mesmo que a exploração do imóvel se desse em afronta as leis ambientais ou até mesmo com trabalho escravo. Uma interpretação, obviamente, absurda.
Quais suas perspectivas para o próximo período?
Acredito que, com as experiências acumuladas, é possível aperfeiçoar os instrumentos para avançar mais na democratização do acesso à terra e na efetiva realização da Reforma Agrária.
No próximo período, uma área que deve merecer especial e destacada atenção é a que trata do desenvolvimento dos assentamentos.
A questão do desenvolvimento deve ser um dos principais pilares da política de Reforma Agrária. É preciso organizar a produção e articular as cadeias produtivas de forma a gerar renda para as famílias assentadas.
Para isso, uma efetiva Assistência Técnica gratuita e integral é fundamental. A nova Lei da ATER (Lei nº 12.188/10) representa um importante passo nesse sentido. Da mesma forma, o fornecimento de produtos pelos assentados para a merenda escolar representa um avanço significativo e importante (Lei nº 11.947/09).
Enfim, penso que a realização da Reforma Agrária depende de vontade política e uma efetiva atuação dos três poderes da República. Por outro lado, é fundamental a existência dos movimentos sociais organizados reivindicando a efetivação da Constituição da República.
Da Página do MST
Um balanço sobre a eficácia do Incra durante o governo Lula demonstra a existência de mais de 200 processos de desapropriação suspensos por juízes.
Leia a íntegra da entrevista com Valdez Adriani Farias, procurador federal do Incra de Santa Catarina, sobre a atuação do instituto.
Você acha que os instrumentos legais do Incra são eficientes?
Os instrumentos postos à disposição do Incra podem ser mais eficientes. Alguns precisam ser reformulados, outros melhor compreendidos ou potencializados. Refiro-me aos instrumentos para aquisição de terras, os quais são fundamentais para uma efetiva democratização do acesso à terra.
Por exemplo, um dos instrumentos é a aquisição de imóveis pela modalidade compra e venda, a qual vem sendo pouco utilizada porque a forma de pagamento se dá em condições e prazos parecidos com a desapropriação-sanção e que não são bem aceitos pelo mercado imobiliário.
Então, sendo a compra um ato que depende da concordância do vendedor, poucos proprietários concordam em vender os imóveis nas condições e prazos previstos no Dec. 433/92.
Esse instrumento, que é complementar à desapropriação, poderia ser potencializado com uma reformulação no sentido de prever prazos e condições condizentes como mercado de terras.
Quais são as vantagens desse instrumento?
Primeira: o Incra utilizaria o instrumento somente para comprar terras de qualidade e localizadas próximas dos grandes centros ou com fácil escoamento da produção.
Segunda: evita-se a judicialização, pois a compra e venda é encerrada com uma escritura pública. Terceira: evita-se o pagamento dos pesados juros compensatórios e moratórios que incidem nos processos judiciais de desapropriação.
Mas repito, esse instrumento é complementar à desapropriação e não pode substituí-la.
A desapropriação-sanção deve ser o principal instrumento do Incra para aquisição de imóveis. Mas a eficiência desse instrumento depende da atualização dos índices de produtividade, que como sabemos estão muito defasados, pois baseados no Censo Agropecuário de 1975.
Por que o Poder Judiciário atrasa os processos de desapropriação?
A eficiência do instrumento da desapropriação-sanção depende de uma mudança de entendimento que predomina no âmbito do Judiciário. Veja que em função da importância e da urgência da Reforma Agrária, o Constituinte dispôs que o processo de desapropriação teria rito sumário.
Passada meia década a Lei Complementar 76/93 regulou este dispositivo, e no seu artigo 18 dispôs que o processo judicial de desapropriação por interesse social para fins de Reforma Agrária tem caráter preferencial e prejudicial em relação a outros processos que envolvam o imóvel.
A Constituição é clara, a lei é claríssima, mas a maioria esmagadora dos juízes que possuem visão eminentemente civilista continua suspendendo os processos de desapropriação em clara afronta à Constituição e à Lei Complementar.
Que problemas burocráticos o Incra precisa resolver?
Problemas burocráticos existem, mas estes podem ser resolvidos com gestão. Penso que o problema está num outro patamar. É que a efetiva implementação da Reforma Agrária por certo é de responsabilidade dos três Poderes da República. Não depende somente do Executivo.
Veja o processo de desapropriação quase sempre é judicializado, e a efetiva destinação da área para Reforma Agrária depende do judiciário. É preciso que o judiciário aplique a Constituição e a Lei Complementar que dispõe que o processo de desapropriação deve obedecer rito sumário e deve ter trâmite preferencial.
Não é possível que um processo que encerra uma urgência e tem em vista o atendimento de um interesse social já declarado pelo Presidente da República fique no aguardo do desfecho de uma ação declaratória de produtividade ajuizada pelo proprietário do imóvel.
Insisto nesse ponto, pois segundo levantamento realizado pela Procuradoria do Incra, existiam mais de 200 processos de desapropriação suspensos em face desse entendimento que simplesmente desconsidera a previsão constitucional e legal.
O Poder Legislativo, por sua vez, não tem atuado para aperfeiçoar o ordenamento no tocante a Reforma Agrária. Exemplo disso é a PEC 438/2001, que prevê a expropriação dos imóveis com trabalho escravo, a qual está parada na Câmara desde 2004, e, portanto, já tramita no parlamento há quase uma década. Se não bastasse essa inércia as investidas do legislativo por meio de CPI´s são na linha da criminalização dos movimentos sociais que lutam pela terra, o que é lamentável.
Como solucionar as falhas do Incra?
Eventuais falhas administrativas podem ser corrigidas com um processo contínuo de melhoria na gestão. A melhora do desempenho da autarquia no tocante à intervenção fundiária depende dentre outros aspectos da realização de algumas alterações legislativas. Algumas alterações podem ser realizadas através de decreto, e, portanto, estão no âmbito de competência do Executivo, outras já dependem do Legislativo.
Como você avalia as condições de trabalho dos servidores do Incra?
As condições de trabalho melhoraram consideravelmente no governo Lula. A autarquia passou por um processo de fortalecimento. O orçamento destinado ao Incra aumentou expressivamente. Novos concursos foram realizados. Na questão salarial, apesar de alguns avanços, o certo é que ainda existe um déficit em relação a outras carreiras do serviço público federal. Esta é uma questão importante que deve ser corrigida e resolvida para evitar que as carreiras do Incra sejam esvaziadas com a perda de profissionais muito qualificados.
Como você analisa as experiências de Reforma Agrária durante o governo Lula?
Temos convicção que avançamos, mas não com a intensidade e com a qualidade que queríamos. Um aspecto positivo que diferencia o governo Lula é no tocante ao reconhecimento dos movimentos sociais enquanto interlocutores dos trabalhadores rurais organizados.
A questão da terra foi vista como um problema social que deve ser resolvido, não como caso de polícia. Pelo menos no âmbito do Poder Executivo, não se criminalizou os movimentos sociais. Essa compreensão que tem clareza do papel do movimento social é importante ponto de partida para chegarmos a bom termo e soluções efetivas.
Na área jurídica, pode se dizer que avançamos em alguns aspectos que reputo importantes, como a questão da função social da propriedade. Desde o lançamento do 2º Plano Nacional de Reforma Agrária passamos a resgatar o conceito constitucional de função social da propriedade. Passamos a defender a necessidade de dar efetividade ao art. 186 da Constituição em toda a sua plenitude.
Assim, o alvo da Reforma Agrária passou a ser não só o imóvel improdutivo, mas também aquele que seu proprietário descumpre as leis trabalhistas, ambientais e de bem-estar.
O Incra vem sendo orientado para proceder a fiscalização de todos estes aspectos. Até então, a função social era reduzida apenas ao aspecto econômico, de forma que o imóvel considerado produtivo ficava imune à desapropriação-sanção mesmo que a exploração do imóvel se desse em afronta as leis ambientais ou até mesmo com trabalho escravo. Uma interpretação, obviamente, absurda.
Quais suas perspectivas para o próximo período?
Acredito que, com as experiências acumuladas, é possível aperfeiçoar os instrumentos para avançar mais na democratização do acesso à terra e na efetiva realização da Reforma Agrária.
No próximo período, uma área que deve merecer especial e destacada atenção é a que trata do desenvolvimento dos assentamentos.
A questão do desenvolvimento deve ser um dos principais pilares da política de Reforma Agrária. É preciso organizar a produção e articular as cadeias produtivas de forma a gerar renda para as famílias assentadas.
Para isso, uma efetiva Assistência Técnica gratuita e integral é fundamental. A nova Lei da ATER (Lei nº 12.188/10) representa um importante passo nesse sentido. Da mesma forma, o fornecimento de produtos pelos assentados para a merenda escolar representa um avanço significativo e importante (Lei nº 11.947/09).
Enfim, penso que a realização da Reforma Agrária depende de vontade política e uma efetiva atuação dos três poderes da República. Por outro lado, é fundamental a existência dos movimentos sociais organizados reivindicando a efetivação da Constituição da República.
terça-feira, 23 de novembro de 2010
Gargalos para desapropriações prejudicam Reforma Agrária
Por Vanessa Ramos
Da Página do MST
O 2º Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), elaborado durante o primeiro mandato do presidente Lula, previa desapropriar 30 milhões de hectares de terras para assentar um milhão de famílias. Tratava-se, portanto, de desapropriar uma quantidade grande terras, hoje nas mãos de latifundiários.
No entanto, inúmeros tropeços e dificuldades enfrentados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) prejudicaram a implementação das medidas que garantiriam a desapropriação das terras.
Em 2009, por exemplo, o governo assentou de fato 23 mil famílias apenas, segundo Ariovaldo Umbelino, professor de Geografia Agrária da Universidade de São Paulo (USP).
Para ele, o papel desempenhado pelo Incra continua o mesmo dos tempos do governo do Fernando Henrique, Itamar Franco, Fernando Collor de Mello e no governo militar. “O Incra só fez assentamento onde há pressão e conflito. Do contrário, ele nunca esteve empenhado em cumprir o que o plano estabelecia”, disse.
Função social
A Constituição brasileira, promulgada em 1988, determina um latifúndio será desapropriado, de acordo com o artigo 186, quando o proprietário não faz um aproveitamento racional e adequado; não preserva o meio ambiente; desrespeita as leis trabalhistas e prejudica o bem-estar social.
De acordo com Valdez Adriani Farias, procurador federal do Incra de Santa Catarina, somente depois do lançamento da 2º PNRA, o alvo da Reforma Agrária passou a ser na prática não só as terras improdutivas, mas também aquelas em que o proprietário descumpria a sua função social, ou seja, as leis trabalhistas, ambientais e de bem-estar.
“O Incra vem sendo orientado para fazer a fiscalização de todos estes aspectos. Até então, a função social era reduzida apenas ao aspecto econômico, de forma que o imóvel considerado produtivo ficava imune à desapropriação ou sanção, mesmo que a exploração do imóvel se desse em afronta as leis ambientais ou até mesmo com trabalho escravo. Uma interpretação, obviamente, absurda”, desabafou Valdez.
No entanto, a primeira área desapropriada pelo Incra por desrespeitar a legislação ambiental foi a Fazenda Alegria, em Felisburgo, em 2009. Nessa área, foram mortos cinco Sem Terra seis anos atrás. O latifundiário ainda tenta suspender o processo na Justiça.
Em relação às questões trabalhistas, a Proposta de Emenda Constitucional 438/2001, que prevê o confisco de terras de latifundiários que exploram trabalho escravo, está parada aguardando votação desde 2004 na Câmara dos Deputados.
Nesse quadro, foram assentadas muito menos famílias do que o esperado. Cerca de 220 mil famílias em oito anos, sustenta Umbelino. No segundo mandato, a situação ficou ainda pior, porque não foi elaborado um novo plano nacional. “O governo se descompromissou em fazer a Reforma Agrária e passou a adotar uma política de contra a Reforma Agrária”, avalia o professor da USP.
Segundo o Dr. Rosinha, deputado federal do PT-PR, o Incra tem de fato ainda muitas dificuldades de implementar medidas de desapropriação de terras no Brasil. Para ele, não é falta de vontade política, mas ausência de quadros de funcionários.
“Hoje o número de funcionários do Incra é insuficiente para a viabilização todo um programa de Reforma Agrária, mesmo que tenha maior disponibilidade orçamentária, o número de funcionário não daria conta de executar as tarefas”, informou.
Gargalos no Poder Judiciário
Para Umbelino, o Brasil têm leis suficientes para resolver os problemas da estrutura agrária do país. “A questão é que o Ministério Público não fez ações para obrigar o Incra a fazer a Reforma Agrária. O que está faltando é isso, pressão do Ministério Público”, contou.
Contudo, os instrumentos postos à disposição do Incra podem ser mais eficientes, na opinião de Valdez. Alguns precisam ser reformulados e outros melhor compreendidos ou potencializados.
Por exemplo, um dos instrumentos a ser utilizado pelo órgão é a aquisição de imóveis pela modalidade compra e venda. Este método vem sendo pouco utilizado porque a forma de pagamento se dá em condições e prazos parecidos com a desapropriação ou a sanção, que não são bem aceitos pelo mercado imobiliário.
“Sendo a compra um ato que depende da concordância do vendedor, poucos proprietários concordam em vender os imóveis nas condições e prazos previstos no Dec. 433/92. Este instrumento, que é complementar à desapropriação, poderia ser potencializado com uma reformulação no sentido de prever prazos e condições condizentes como mercado de terras”, explicou o procurador federal.
Ainda na opinião do procurador, esse instrumento propicia vantagens. Uma delas é que o Incra utilizaria essa ferramenta somente para comprar terras de qualidade e localizadas próximas aos grandes centros ou com fácil escoamento da produção.
Além disso, seria possível evitar a judicialização, ou seja, compra e venda é encerrada com uma escritura pública. Outro benefício é a possível diminuição de pagamentos dos pesados juros compensatórios e moratórios que incidem nos processos judiciais de desapropriação.
“Mas repito, este instrumento é complementar à desapropriação e não pode substituí-la. A desapropriação-sanção deve ser o principal instrumento do Incra para aquisição de imóveis. Mas a eficiência desse instrumento depende da atualização dos índices de produtividade, que como sabemos estão muito defasados, pois estão baseados no Censo Agropecuário de 1975”, reforça Valdez.
Assim, a eficiência do instrumento da desapropriação depende, sobretudo, de uma mudança de entendimento que predomina no âmbito do Judiciário.
A Lei Complementar 76/93, no artigo 18, ordena que o processo judicial de desapropriação por interesse social para fins de Reforma Agrária tem caráter preferencial e prejudicial em relação a outros processos que envolvam o imóvel.
“A Constituição é clara, mas a maioria esmagadora dos juízes que possuem visão eminentemente civilista continua suspendendo os processos de desapropriação em clara afronta à Constituição e à Lei Complementar”, afirmou o promotor.
Por essa razão, os processos se prolongam por vários anos, o que atrasa consideravelmente a implantação da Reforma Agrária, além de elevar os custos, pois as indenizações acabam incidindo pesados juros compensatórios.
Perspectivas
A solução definitiva desses problemas depende, segundo Valdez, da boa vontade dos Poder Judiciário em aplicar a Constituição e a Lei Complementar que ordena que o processo de desapropriação deva ter trâmite preferencial.
Para ele, os problemas burocráticos existem, mas podem ser resolvidos com gestão. E completa ao dizer que não é concebível “é que um processo que encerra uma urgência e tem em vista o atendimento de um interesse social, já declarado pelo Presidente da República, fique no aguardo do desfecho de uma ação declaratória de produtividade ajuizada pelo proprietário do imóvel”.
Um levantamento realizado pela Procuradoria do Incra informa que existem mais de 200 processos de desapropriação suspensos em face desse entendimento que, de acordo com o procurador federal do Incra, simplesmente desconsidera a previsão constitucional e legal.
“Portanto, penso que a realização da Reforma Agrária depende de vontade política e de uma efetiva atuação dos três poderes da República. Por outro lado, é fundamental a existência dos movimentos sociais organizados reivindicando a efetivação da Constituição da República”, finalizou Valdez.
Da Página do MST
O 2º Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), elaborado durante o primeiro mandato do presidente Lula, previa desapropriar 30 milhões de hectares de terras para assentar um milhão de famílias. Tratava-se, portanto, de desapropriar uma quantidade grande terras, hoje nas mãos de latifundiários.
No entanto, inúmeros tropeços e dificuldades enfrentados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) prejudicaram a implementação das medidas que garantiriam a desapropriação das terras.
Em 2009, por exemplo, o governo assentou de fato 23 mil famílias apenas, segundo Ariovaldo Umbelino, professor de Geografia Agrária da Universidade de São Paulo (USP).
Para ele, o papel desempenhado pelo Incra continua o mesmo dos tempos do governo do Fernando Henrique, Itamar Franco, Fernando Collor de Mello e no governo militar. “O Incra só fez assentamento onde há pressão e conflito. Do contrário, ele nunca esteve empenhado em cumprir o que o plano estabelecia”, disse.
Função social
A Constituição brasileira, promulgada em 1988, determina um latifúndio será desapropriado, de acordo com o artigo 186, quando o proprietário não faz um aproveitamento racional e adequado; não preserva o meio ambiente; desrespeita as leis trabalhistas e prejudica o bem-estar social.
De acordo com Valdez Adriani Farias, procurador federal do Incra de Santa Catarina, somente depois do lançamento da 2º PNRA, o alvo da Reforma Agrária passou a ser na prática não só as terras improdutivas, mas também aquelas em que o proprietário descumpria a sua função social, ou seja, as leis trabalhistas, ambientais e de bem-estar.
“O Incra vem sendo orientado para fazer a fiscalização de todos estes aspectos. Até então, a função social era reduzida apenas ao aspecto econômico, de forma que o imóvel considerado produtivo ficava imune à desapropriação ou sanção, mesmo que a exploração do imóvel se desse em afronta as leis ambientais ou até mesmo com trabalho escravo. Uma interpretação, obviamente, absurda”, desabafou Valdez.
No entanto, a primeira área desapropriada pelo Incra por desrespeitar a legislação ambiental foi a Fazenda Alegria, em Felisburgo, em 2009. Nessa área, foram mortos cinco Sem Terra seis anos atrás. O latifundiário ainda tenta suspender o processo na Justiça.
Em relação às questões trabalhistas, a Proposta de Emenda Constitucional 438/2001, que prevê o confisco de terras de latifundiários que exploram trabalho escravo, está parada aguardando votação desde 2004 na Câmara dos Deputados.
Nesse quadro, foram assentadas muito menos famílias do que o esperado. Cerca de 220 mil famílias em oito anos, sustenta Umbelino. No segundo mandato, a situação ficou ainda pior, porque não foi elaborado um novo plano nacional. “O governo se descompromissou em fazer a Reforma Agrária e passou a adotar uma política de contra a Reforma Agrária”, avalia o professor da USP.
Segundo o Dr. Rosinha, deputado federal do PT-PR, o Incra tem de fato ainda muitas dificuldades de implementar medidas de desapropriação de terras no Brasil. Para ele, não é falta de vontade política, mas ausência de quadros de funcionários.
“Hoje o número de funcionários do Incra é insuficiente para a viabilização todo um programa de Reforma Agrária, mesmo que tenha maior disponibilidade orçamentária, o número de funcionário não daria conta de executar as tarefas”, informou.
Gargalos no Poder Judiciário
Para Umbelino, o Brasil têm leis suficientes para resolver os problemas da estrutura agrária do país. “A questão é que o Ministério Público não fez ações para obrigar o Incra a fazer a Reforma Agrária. O que está faltando é isso, pressão do Ministério Público”, contou.
Contudo, os instrumentos postos à disposição do Incra podem ser mais eficientes, na opinião de Valdez. Alguns precisam ser reformulados e outros melhor compreendidos ou potencializados.
Por exemplo, um dos instrumentos a ser utilizado pelo órgão é a aquisição de imóveis pela modalidade compra e venda. Este método vem sendo pouco utilizado porque a forma de pagamento se dá em condições e prazos parecidos com a desapropriação ou a sanção, que não são bem aceitos pelo mercado imobiliário.
“Sendo a compra um ato que depende da concordância do vendedor, poucos proprietários concordam em vender os imóveis nas condições e prazos previstos no Dec. 433/92. Este instrumento, que é complementar à desapropriação, poderia ser potencializado com uma reformulação no sentido de prever prazos e condições condizentes como mercado de terras”, explicou o procurador federal.
Ainda na opinião do procurador, esse instrumento propicia vantagens. Uma delas é que o Incra utilizaria essa ferramenta somente para comprar terras de qualidade e localizadas próximas aos grandes centros ou com fácil escoamento da produção.
Além disso, seria possível evitar a judicialização, ou seja, compra e venda é encerrada com uma escritura pública. Outro benefício é a possível diminuição de pagamentos dos pesados juros compensatórios e moratórios que incidem nos processos judiciais de desapropriação.
“Mas repito, este instrumento é complementar à desapropriação e não pode substituí-la. A desapropriação-sanção deve ser o principal instrumento do Incra para aquisição de imóveis. Mas a eficiência desse instrumento depende da atualização dos índices de produtividade, que como sabemos estão muito defasados, pois estão baseados no Censo Agropecuário de 1975”, reforça Valdez.
Assim, a eficiência do instrumento da desapropriação depende, sobretudo, de uma mudança de entendimento que predomina no âmbito do Judiciário.
A Lei Complementar 76/93, no artigo 18, ordena que o processo judicial de desapropriação por interesse social para fins de Reforma Agrária tem caráter preferencial e prejudicial em relação a outros processos que envolvam o imóvel.
“A Constituição é clara, mas a maioria esmagadora dos juízes que possuem visão eminentemente civilista continua suspendendo os processos de desapropriação em clara afronta à Constituição e à Lei Complementar”, afirmou o promotor.
Por essa razão, os processos se prolongam por vários anos, o que atrasa consideravelmente a implantação da Reforma Agrária, além de elevar os custos, pois as indenizações acabam incidindo pesados juros compensatórios.
Perspectivas
A solução definitiva desses problemas depende, segundo Valdez, da boa vontade dos Poder Judiciário em aplicar a Constituição e a Lei Complementar que ordena que o processo de desapropriação deva ter trâmite preferencial.
Para ele, os problemas burocráticos existem, mas podem ser resolvidos com gestão. E completa ao dizer que não é concebível “é que um processo que encerra uma urgência e tem em vista o atendimento de um interesse social, já declarado pelo Presidente da República, fique no aguardo do desfecho de uma ação declaratória de produtividade ajuizada pelo proprietário do imóvel”.
Um levantamento realizado pela Procuradoria do Incra informa que existem mais de 200 processos de desapropriação suspensos em face desse entendimento que, de acordo com o procurador federal do Incra, simplesmente desconsidera a previsão constitucional e legal.
“Portanto, penso que a realização da Reforma Agrária depende de vontade política e de uma efetiva atuação dos três poderes da República. Por outro lado, é fundamental a existência dos movimentos sociais organizados reivindicando a efetivação da Constituição da República”, finalizou Valdez.
Países pobres irão pagar 11% a mais por alimentos
Paulo Daniel
De acordo com a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), a conta paga pela importação de alimentos no mundo deve ultrapassar a marca de US$ 1 trilhão, equivalentes a R$ 1,7 trilhão até o fim deste ano. O motivo é uma alta drástica no preço da maioria das commodities em 2009.
No relatório “Panorama do Alimento”, a agência da ONU também alertou a comunidade internacional a se preparar para ‘tempos mais duros’ caso a produção de itens básicos da cesta de alimentação não aumente no próximo ano.
Segundo a FAO, os países mais pobres terão que pagar 11% a mais para importar alimentos. Este valor quase dobra para os países de renda baixa e com problemas de segurança alimentar.
Ao ultrapassar a marca de US$ 1 trilhão, a conta de importação de comida atingirá um nível jamais visto desde a crise alimentar mundial, em 2008. Com este quadro de pressão, o mundo terá que permanecer vigilante e preparado a respeito de novos choques em 2011.
As más condições do tempo foram apontadas como um dos fatores agravantes. Apesar de previsões favoráveis, a produção mundial de cereais deve se contrair em 2% e não se expandir em mais de 1% como foi anunciado.
O estoque global de cereais também cairá bastante. Segundo o relatório da FAO, deverá haver uma contração de 7% em media. A agência pediu que os inventários de alimentos sejam reabastecidos. A previsão é de queda de 35% para a cevada, 12% para o milho e 10% para o trigo. Apenas o arroz deve subir, cerca de 6%.
Para tanto, os consumidores não terão outra alternativa a não ser pagar mais pelos alimentos. Um outro fator para o aumento dos preços, em meses recentes, foi a volatidade no mercado do acúçar, que atingiu picos recordes dos últimos 30 anos. No setor da oleaginosas, os preços continuam relativamente baixos.
Já a carne está mais cara. Na área de leites e derivados, o preço da manteiga bateu novos recordes. O preço da mandioca também subiu.
Por último, o pescado registrou ganhos demonstrando uma boa recuperação após a queda nos preços no fim de 2008.
Paulo Daniel, economista, mestre em economia política pela PUC-SP, professor de economia e editor do Blog Além de economia.
De acordo com a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), a conta paga pela importação de alimentos no mundo deve ultrapassar a marca de US$ 1 trilhão, equivalentes a R$ 1,7 trilhão até o fim deste ano. O motivo é uma alta drástica no preço da maioria das commodities em 2009.
No relatório “Panorama do Alimento”, a agência da ONU também alertou a comunidade internacional a se preparar para ‘tempos mais duros’ caso a produção de itens básicos da cesta de alimentação não aumente no próximo ano.
Segundo a FAO, os países mais pobres terão que pagar 11% a mais para importar alimentos. Este valor quase dobra para os países de renda baixa e com problemas de segurança alimentar.
Ao ultrapassar a marca de US$ 1 trilhão, a conta de importação de comida atingirá um nível jamais visto desde a crise alimentar mundial, em 2008. Com este quadro de pressão, o mundo terá que permanecer vigilante e preparado a respeito de novos choques em 2011.
As más condições do tempo foram apontadas como um dos fatores agravantes. Apesar de previsões favoráveis, a produção mundial de cereais deve se contrair em 2% e não se expandir em mais de 1% como foi anunciado.
O estoque global de cereais também cairá bastante. Segundo o relatório da FAO, deverá haver uma contração de 7% em media. A agência pediu que os inventários de alimentos sejam reabastecidos. A previsão é de queda de 35% para a cevada, 12% para o milho e 10% para o trigo. Apenas o arroz deve subir, cerca de 6%.
Para tanto, os consumidores não terão outra alternativa a não ser pagar mais pelos alimentos. Um outro fator para o aumento dos preços, em meses recentes, foi a volatidade no mercado do acúçar, que atingiu picos recordes dos últimos 30 anos. No setor da oleaginosas, os preços continuam relativamente baixos.
Já a carne está mais cara. Na área de leites e derivados, o preço da manteiga bateu novos recordes. O preço da mandioca também subiu.
Por último, o pescado registrou ganhos demonstrando uma boa recuperação após a queda nos preços no fim de 2008.
Paulo Daniel, economista, mestre em economia política pela PUC-SP, professor de economia e editor do Blog Além de economia.
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Biosfera ameaçada
por Amâncio Friaça
No romance de ficção científica A guerra dos mundos, de H. G. Wells, os invasores marcianos, com tecnologia muito mais avançada que a dos terráqueos, conquistam nosso planeta sem qualquer dificuldade. Em seus cilindros, os marcianos trazem não só suas máquinas, mas também o “mato vermelho”, uma forma agressiva de vegetação marciana que se alastra por todos os ecossistemas da Terra. A invasão é, assim, realizada por seres inteligentes e por uma biosfera alienígena.
Da mesma forma, o ser humano tornou-se invasor de seu próprio planeta, impondo monotonia à biosfera. Felizmente, ele se deu conta de que sua sobrevivência dependerá da diversidade da vida e começou a provomer ações para deter as perdas de biodiversidade. Em 1992, a Conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a ECO-92, adotou a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB). Desde 2002, 193 países signatários da CDB comprometeram-se a reduzir significativamente as perdas de biodiversidade até 2010. Por esse motivo, a ONU declarou este como o Ano Internacional da Biodiversidade e, em outubro, em Nagoya, a décima Conferência das Partes da CBD (COP-10/CDB) define novas metas para a redução da perda de biodiversidade. E as respostas têm sido cada vez mais numerosas.
Contudo, esse crescimento está desacelerando e não vem acompanhando o ritmo constante de aumento das pressões sobre a biodiversidade. É este o cenário que se desenhou nos últimos 40 anos. Há um ciclo de feedback entre quatro componentes: respostas à perda de biodiversidade, pressões sobre ela, o estado da biodiversidade e os benefícios que ela oferece. O estado da biodiversidade é a medida da variedade das manifestações da vida da biosfera: genes, espécies e níveis de organização ecológica – populações, comunidades, ecossistemas. Como as respostas não estão contrabalançando as pressões, ele está em declínio constante. Em consequência, o quarto componente do ciclo, o dos benefícios da diversidade, exibe uma queda, que de início foi gradual, mas está cada vez mais acelerada. Se essa tendência prosseguir, haverá uma escalada da redução dos serviços da biodiversidade, com consequências catastróficas.
A biodiversidade é essencial à sociedade. Os benefícios materiais incluem bens (alimentos, madeira, fibras, medicamentos e combustíveis) e funções de estabilização (controle de enchentes, regulação climática e ciclos de nutrientes). Ela favorece a agricultura por meio da polinização e controle de pragas, fornece armazenagem e sequestro de carbono, regula a disponibilidade de água doce. Calcula-se que o valor econômico desses benefícios seja de dez a 100 vezes maior que o custo de mantê-los.
Os benefícios não materiais da biodiversidade são de fundamental importância para a definição do humano: a fruição da beleza, o senso do sublime, a apreensão das escalas da natureza. A biosfera oferece não só lazer, mas também locais de silêncio e celebração, de reflexão e contemplação. A diversidade da vida é um dos fundamentos do mundo simbólico, que será tremendamente empobrecido se a biodiversidade for solapada. A perda dos serviços materiais da biodiversidade se traduz em cifras apavorantes: trilhões de dólares de prejuízo, centenas de milhões de pessoas desalojadas, milhões de mortos. Os efeitos não materiais da perda de biodiversidade são dificilmente quantificáveis, mas conduzirão a uma desumanização de nós mesmos.
Sinais de vida no planeta
O crescimento demográfico global e o aumento do consumo per capita provocaram uma explosão das perdas de biodiversidade. Entre os problemas estão o uso abundante de água na agricultura, indústria e domicílios, assim como novos hábitos alimentares, com dietas ricas em proteínas, que demandam pesca intensiva, ameaçando a biodiversidade marinha, e a expansão da agropecuária, que acarreta a destruição de habitats terrestres.
As pressões sobre a biodiversidade fazem parte de todo um conjunto de perturbações humanas nos sistemas biogeoquímicos da Terra. O modelo dos limiares planetários estabeleceu limites de interferência humana a nove sistemas que não podem ser violados, sob pena de comprometer o futuro da humanidade. Três desses limites já foram excedidos, o mais conhecido sendo o da mudança climática. Porém, a transgressão mais séria é a perda de biodiversidade. A taxa de extinção de espécies é de cem a mil vezes superior à do nível pré-industrial.
A biodiversidade assegura a constância do fluxo de benefícios da natureza para a humanidade. A biosfera desempenha funções reguladoras nos ciclos da água e dos elementos biogênicos – carbono, nitrogênio, fósforo. O oxigênio da atmosfera é produzido pelas plantas e, principalmente, pelas cianobactérias (bactérias que realizam a fotossíntese). Se a vida no planeta se extinguisse, o oxigênio desapareceria da atmosfera em apenas 10 milhões de anos, um breve momento dos 4,55 bilhões de anos da idade da Terra.
Os micróbios são os organismos com a maior diversidade do planeta. A variação da riqueza de espécies das bactérias é maior que a das plantas ao se comparar populações em diversas latitudes e altitudes. Os micróbios perfazem 90% da massa biológica da Terra, a maior parte dela abaixo da superfície. Portanto, os micro-organismos constituem a base do funcionamento dos ecossistemas.
A dimensão bioquímica da biodiversidade é tipificada pelos micróbios devido à sua grande variedade de vias metabólicas. As bactérias metanogênicas, anaeróbicas e produtoras de metano são essenciais para o cômputo do metano, um importante gás do efeito estufa. As metanogênicas podem ser vistas como vilãs hoje, mas há bilhões de anos salvaram a biosfera. O Sol era então mais fraco e a vasta quantidade de metano liberada pelas bactérias gerou um aquecimento global que evitou o congelamento total da Terra. E há também as cianobactérias, que há 2,7 bilhões de anos enriquecem a atmosfera com oxigênio. Sem elas, não existiríamos.
A maior lacuna no conhecimento dos ecossistemas é o papel desempenhado pelos micróbios. Uma compreensão maior da associação das bactérias com plantas, fungos, animais e ambientes – aquáticos e terrestres – na constituição da biodiversidade da Terra, em conjunto com a teoria da resiliência, provocará uma revolução no uso dos serviços da biodiversidade.
Cianobactérias e seres humanos são as espécies com maior impacto no planeta. É lógico, portanto, considerarmos o mundo microbiano em conjunto com as pressões antropogênicas na biodiversidade. Doenças causadas por micróbios, atingindo humanos, plantas e animais, seriam um aspecto nefasto dessa interação. No final da Guerra dos mundos, tanto os marcianos como o “mato vermelho” morrem, derrotados por singelos micróbios contra os quais não têm imunidade. Os micro-organismos poderão dar uma resposta similar a nossas agressões ao ambiente.
Amâncio Friaça é astrofísico e pesquisador do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). É membro do Conselho Editorial do Le Monde Diplomatique Brasil.
No romance de ficção científica A guerra dos mundos, de H. G. Wells, os invasores marcianos, com tecnologia muito mais avançada que a dos terráqueos, conquistam nosso planeta sem qualquer dificuldade. Em seus cilindros, os marcianos trazem não só suas máquinas, mas também o “mato vermelho”, uma forma agressiva de vegetação marciana que se alastra por todos os ecossistemas da Terra. A invasão é, assim, realizada por seres inteligentes e por uma biosfera alienígena.
Da mesma forma, o ser humano tornou-se invasor de seu próprio planeta, impondo monotonia à biosfera. Felizmente, ele se deu conta de que sua sobrevivência dependerá da diversidade da vida e começou a provomer ações para deter as perdas de biodiversidade. Em 1992, a Conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a ECO-92, adotou a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB). Desde 2002, 193 países signatários da CDB comprometeram-se a reduzir significativamente as perdas de biodiversidade até 2010. Por esse motivo, a ONU declarou este como o Ano Internacional da Biodiversidade e, em outubro, em Nagoya, a décima Conferência das Partes da CBD (COP-10/CDB) define novas metas para a redução da perda de biodiversidade. E as respostas têm sido cada vez mais numerosas.
Contudo, esse crescimento está desacelerando e não vem acompanhando o ritmo constante de aumento das pressões sobre a biodiversidade. É este o cenário que se desenhou nos últimos 40 anos. Há um ciclo de feedback entre quatro componentes: respostas à perda de biodiversidade, pressões sobre ela, o estado da biodiversidade e os benefícios que ela oferece. O estado da biodiversidade é a medida da variedade das manifestações da vida da biosfera: genes, espécies e níveis de organização ecológica – populações, comunidades, ecossistemas. Como as respostas não estão contrabalançando as pressões, ele está em declínio constante. Em consequência, o quarto componente do ciclo, o dos benefícios da diversidade, exibe uma queda, que de início foi gradual, mas está cada vez mais acelerada. Se essa tendência prosseguir, haverá uma escalada da redução dos serviços da biodiversidade, com consequências catastróficas.
A biodiversidade é essencial à sociedade. Os benefícios materiais incluem bens (alimentos, madeira, fibras, medicamentos e combustíveis) e funções de estabilização (controle de enchentes, regulação climática e ciclos de nutrientes). Ela favorece a agricultura por meio da polinização e controle de pragas, fornece armazenagem e sequestro de carbono, regula a disponibilidade de água doce. Calcula-se que o valor econômico desses benefícios seja de dez a 100 vezes maior que o custo de mantê-los.
Os benefícios não materiais da biodiversidade são de fundamental importância para a definição do humano: a fruição da beleza, o senso do sublime, a apreensão das escalas da natureza. A biosfera oferece não só lazer, mas também locais de silêncio e celebração, de reflexão e contemplação. A diversidade da vida é um dos fundamentos do mundo simbólico, que será tremendamente empobrecido se a biodiversidade for solapada. A perda dos serviços materiais da biodiversidade se traduz em cifras apavorantes: trilhões de dólares de prejuízo, centenas de milhões de pessoas desalojadas, milhões de mortos. Os efeitos não materiais da perda de biodiversidade são dificilmente quantificáveis, mas conduzirão a uma desumanização de nós mesmos.
Sinais de vida no planeta
O crescimento demográfico global e o aumento do consumo per capita provocaram uma explosão das perdas de biodiversidade. Entre os problemas estão o uso abundante de água na agricultura, indústria e domicílios, assim como novos hábitos alimentares, com dietas ricas em proteínas, que demandam pesca intensiva, ameaçando a biodiversidade marinha, e a expansão da agropecuária, que acarreta a destruição de habitats terrestres.
As pressões sobre a biodiversidade fazem parte de todo um conjunto de perturbações humanas nos sistemas biogeoquímicos da Terra. O modelo dos limiares planetários estabeleceu limites de interferência humana a nove sistemas que não podem ser violados, sob pena de comprometer o futuro da humanidade. Três desses limites já foram excedidos, o mais conhecido sendo o da mudança climática. Porém, a transgressão mais séria é a perda de biodiversidade. A taxa de extinção de espécies é de cem a mil vezes superior à do nível pré-industrial.
A biodiversidade assegura a constância do fluxo de benefícios da natureza para a humanidade. A biosfera desempenha funções reguladoras nos ciclos da água e dos elementos biogênicos – carbono, nitrogênio, fósforo. O oxigênio da atmosfera é produzido pelas plantas e, principalmente, pelas cianobactérias (bactérias que realizam a fotossíntese). Se a vida no planeta se extinguisse, o oxigênio desapareceria da atmosfera em apenas 10 milhões de anos, um breve momento dos 4,55 bilhões de anos da idade da Terra.
Os micróbios são os organismos com a maior diversidade do planeta. A variação da riqueza de espécies das bactérias é maior que a das plantas ao se comparar populações em diversas latitudes e altitudes. Os micróbios perfazem 90% da massa biológica da Terra, a maior parte dela abaixo da superfície. Portanto, os micro-organismos constituem a base do funcionamento dos ecossistemas.
A dimensão bioquímica da biodiversidade é tipificada pelos micróbios devido à sua grande variedade de vias metabólicas. As bactérias metanogênicas, anaeróbicas e produtoras de metano são essenciais para o cômputo do metano, um importante gás do efeito estufa. As metanogênicas podem ser vistas como vilãs hoje, mas há bilhões de anos salvaram a biosfera. O Sol era então mais fraco e a vasta quantidade de metano liberada pelas bactérias gerou um aquecimento global que evitou o congelamento total da Terra. E há também as cianobactérias, que há 2,7 bilhões de anos enriquecem a atmosfera com oxigênio. Sem elas, não existiríamos.
A maior lacuna no conhecimento dos ecossistemas é o papel desempenhado pelos micróbios. Uma compreensão maior da associação das bactérias com plantas, fungos, animais e ambientes – aquáticos e terrestres – na constituição da biodiversidade da Terra, em conjunto com a teoria da resiliência, provocará uma revolução no uso dos serviços da biodiversidade.
Cianobactérias e seres humanos são as espécies com maior impacto no planeta. É lógico, portanto, considerarmos o mundo microbiano em conjunto com as pressões antropogênicas na biodiversidade. Doenças causadas por micróbios, atingindo humanos, plantas e animais, seriam um aspecto nefasto dessa interação. No final da Guerra dos mundos, tanto os marcianos como o “mato vermelho” morrem, derrotados por singelos micróbios contra os quais não têm imunidade. Os micro-organismos poderão dar uma resposta similar a nossas agressões ao ambiente.
Amâncio Friaça é astrofísico e pesquisador do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). É membro do Conselho Editorial do Le Monde Diplomatique Brasil.
domingo, 21 de novembro de 2010
Agricultura Familiar é destaque nas Comunidades Quilombolas
Mais de 100 anos depois da abolição da escravatura, os quilombos ainda são uma realidade. Na Bahia, por exemplo, existem 808 comunidades quilombolas, das quais 206 já estão certificadas pela Fundação Palmares. Um dos destaques é o Campo Grande, no município de Santa Terezinha, Território Piemonte do Paraguaçu, que possui 240 famílias de descendentes de escravos, que ainda tem a agricultura como atividade principal.
Dentro dessa vertente, a Secretaria da Agricultura (Seagri), por intermédio da Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola (EBDA), órgão responsável pela assistência técnica e extensão rural no estado, vem intensificando suas ações junto aos quilombolas da Bahia. “A missão da EBDA é promover o acesso à assistência técnica, juntamente com a comunidade, utilizando o modelo agroecológico, com o principio da economia solidária, garantindo a qualidade de alimentos e a melhoria de vida das pessoas. Isso resulta em autonomia sóciopolítica, econômica, cultural, ambiental e alimentar”, explica o presidente da empresa, Emerson Leal.
De acordo com a técnica da EBDA no município de Castro Alves e responsável pelas comunidades quilombolas da região, Lucinete Amara, o maior objetivo a ser alcançado é o desenvolvimento rural sustentável, respeitando os princípios e as diretrizes culturais de cada comunidade quilombola.
Este ano, o foco da empresa está voltado para otimizar o acesso dos agricultores familiares junto às linhas de crédito rural, dentre eles, os quilombolas. Para isso, intensificou suas atividades de emissão de Declarações de Aptidão (DAP). O documento é o instrumento que identifica o agricultor familiar como beneficiário do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e é obrigatório para acessar créditos e programas sociais.
“A DAP é o passaporte que dá ao agricultor acesso aos programas sociais dos governos do Estado e federal, às linhas de crédito como o Pronaf A ou B, ao Programa Mais Alimentos, e também garante o direito à assistência técnica e à tecnologia. Portanto, é essencial que os quilombolas façam parte das políticas públicas do estado. Das 240 famílias de Campo Grande, mais da metade já está apta a receber os benefícios dos programas e a meta é inserir 100% dos quilombolas nos programas sociais”, diz Lucinete.
Além disso, a EBDA tem realizado periodicamente capacitações, com a realização do Dias de Campo, palestras, seminários e cursos. O intuito é implantar projetos produtivos comunitários como casa do mel, casa de farinha, hortas, pomares, criação de pequenos animais (galinha-caipira, suínos, caprinos e ovinos, peixes e abelhas) e artesanato.
Ações e resultados
De acordo com a presidente da Associação dos Quilombolas de Campo Grande, Marilene dos Santos, após os cursos de pintura em tecidos e artesanato com palhas oferecidos pela EBDA, as mulheres da comunidade aprenderam a produzir tapetes, bolsas, chapéus, bocapius, que são comercializados nas feiras livres da região.
“Nossas bolsas já são comercializadas entre R$ 15 e R$ 35. Estamos muito empolgadas com as vendas. O curso nos proporcionou mais uma fonte de renda, com a venda das toalhas de prato e bolsas. A meta agora é produzir mais para as festas de fim de ano”, afirma quilombola. O curso de pintura acontecia duas vezes, por semana, para cerca de 20 pessoas, que aprendiam a pintar em toalhas e pano de prato.
Outra ação exitosa é a do apicultor Genivaldo da Silva, mais conhecido na comunidade como ‘Mil’, que participou dos cursos de apicultura e resolveu investir na produção do mel. “Comecei trocando alguns animais (galinhas-caipiras e patos) por caixas de armazenamento de mel. O sucesso foi total. Gostei, e agora só me dedico à produção de mel, já tendo 20 caixas que cabem 120 litros de mel e vendo de R$10 a R$15, o litro. Tenho comprador até de São Paulo e Brasília”.
A EBDA, além dos quilombolas, tem orientado e capacitado estudantes dos ensinos médio e fundamental e interessados em apicultura, meliponicultura, georreferenciamento, manejo avançado para produção do mel, orientações para apicultores e familiares em saúde preventiva e segurança do trabalho, cooperativismo, associativismo e resgate da cultura da abelha nativa sem ferrão, que está em extinção. Estes são alguns dos temas dos seminários, minicursos e palestras disponibilizados, gratuitamente, aos apicultores.
Expectativas
Segundo o diretor de Pecuária da EBDA, Elionaldo Teles, a empresa pretende capacitar todas as comunidades quilombolas da Bahia, pois o sentido é contribuir para o desenvolvimento sóciopolítico e a consciência ambiental das áreas de quilombos. Isso para buscar a identidade e a inclusão social como forma de garantir a sustentabilidade, que há séculos foi negada, resultante da exclusão social escravocrata. “Nossa intenção é oferecer instrumentos que permitam utilizar os recursos naturais de forma equilibrada, em sintonia com a agroecologia”.
O projeto junto aos quilombolas quer elevar a consciência social e possibilitar a participação efetiva dos agricultores nas discussões dos seus direitos enquanto cidadãos. Além disso, também fornecer tecnologias desenvolvidas para atender às necessidades do produtor rural.
Fonte: www.jornalgrandebahia.com.br
Dentro dessa vertente, a Secretaria da Agricultura (Seagri), por intermédio da Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola (EBDA), órgão responsável pela assistência técnica e extensão rural no estado, vem intensificando suas ações junto aos quilombolas da Bahia. “A missão da EBDA é promover o acesso à assistência técnica, juntamente com a comunidade, utilizando o modelo agroecológico, com o principio da economia solidária, garantindo a qualidade de alimentos e a melhoria de vida das pessoas. Isso resulta em autonomia sóciopolítica, econômica, cultural, ambiental e alimentar”, explica o presidente da empresa, Emerson Leal.
De acordo com a técnica da EBDA no município de Castro Alves e responsável pelas comunidades quilombolas da região, Lucinete Amara, o maior objetivo a ser alcançado é o desenvolvimento rural sustentável, respeitando os princípios e as diretrizes culturais de cada comunidade quilombola.
Este ano, o foco da empresa está voltado para otimizar o acesso dos agricultores familiares junto às linhas de crédito rural, dentre eles, os quilombolas. Para isso, intensificou suas atividades de emissão de Declarações de Aptidão (DAP). O documento é o instrumento que identifica o agricultor familiar como beneficiário do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e é obrigatório para acessar créditos e programas sociais.
“A DAP é o passaporte que dá ao agricultor acesso aos programas sociais dos governos do Estado e federal, às linhas de crédito como o Pronaf A ou B, ao Programa Mais Alimentos, e também garante o direito à assistência técnica e à tecnologia. Portanto, é essencial que os quilombolas façam parte das políticas públicas do estado. Das 240 famílias de Campo Grande, mais da metade já está apta a receber os benefícios dos programas e a meta é inserir 100% dos quilombolas nos programas sociais”, diz Lucinete.
Além disso, a EBDA tem realizado periodicamente capacitações, com a realização do Dias de Campo, palestras, seminários e cursos. O intuito é implantar projetos produtivos comunitários como casa do mel, casa de farinha, hortas, pomares, criação de pequenos animais (galinha-caipira, suínos, caprinos e ovinos, peixes e abelhas) e artesanato.
Ações e resultados
De acordo com a presidente da Associação dos Quilombolas de Campo Grande, Marilene dos Santos, após os cursos de pintura em tecidos e artesanato com palhas oferecidos pela EBDA, as mulheres da comunidade aprenderam a produzir tapetes, bolsas, chapéus, bocapius, que são comercializados nas feiras livres da região.
“Nossas bolsas já são comercializadas entre R$ 15 e R$ 35. Estamos muito empolgadas com as vendas. O curso nos proporcionou mais uma fonte de renda, com a venda das toalhas de prato e bolsas. A meta agora é produzir mais para as festas de fim de ano”, afirma quilombola. O curso de pintura acontecia duas vezes, por semana, para cerca de 20 pessoas, que aprendiam a pintar em toalhas e pano de prato.
Outra ação exitosa é a do apicultor Genivaldo da Silva, mais conhecido na comunidade como ‘Mil’, que participou dos cursos de apicultura e resolveu investir na produção do mel. “Comecei trocando alguns animais (galinhas-caipiras e patos) por caixas de armazenamento de mel. O sucesso foi total. Gostei, e agora só me dedico à produção de mel, já tendo 20 caixas que cabem 120 litros de mel e vendo de R$10 a R$15, o litro. Tenho comprador até de São Paulo e Brasília”.
A EBDA, além dos quilombolas, tem orientado e capacitado estudantes dos ensinos médio e fundamental e interessados em apicultura, meliponicultura, georreferenciamento, manejo avançado para produção do mel, orientações para apicultores e familiares em saúde preventiva e segurança do trabalho, cooperativismo, associativismo e resgate da cultura da abelha nativa sem ferrão, que está em extinção. Estes são alguns dos temas dos seminários, minicursos e palestras disponibilizados, gratuitamente, aos apicultores.
Expectativas
Segundo o diretor de Pecuária da EBDA, Elionaldo Teles, a empresa pretende capacitar todas as comunidades quilombolas da Bahia, pois o sentido é contribuir para o desenvolvimento sóciopolítico e a consciência ambiental das áreas de quilombos. Isso para buscar a identidade e a inclusão social como forma de garantir a sustentabilidade, que há séculos foi negada, resultante da exclusão social escravocrata. “Nossa intenção é oferecer instrumentos que permitam utilizar os recursos naturais de forma equilibrada, em sintonia com a agroecologia”.
O projeto junto aos quilombolas quer elevar a consciência social e possibilitar a participação efetiva dos agricultores nas discussões dos seus direitos enquanto cidadãos. Além disso, também fornecer tecnologias desenvolvidas para atender às necessidades do produtor rural.
Fonte: www.jornalgrandebahia.com.br
sábado, 20 de novembro de 2010
Ruralistas pressionam para alterar Código Florestal ainda em 2010
Por Maurício Thuswohl
A bancada ruralista no Congresso Nacional se mobiliza para aprovar ainda na atual legislatura o relatório do deputado Aldo Rebelo, que estabelece mudanças reivindicadas pelo setor
Deixada momentaneamente de lado por conta das eleições presidenciais, a batalha política travada por ruralistas e ambientalistas acerca das mudanças no Código Florestal ressurge com força total. A bancada ruralista no Congresso Nacional se mobiliza para aprovar ainda na atual legislatura o relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que estabelece mudanças no Código reivindicadas pelo setor, como a redução das áreas de Reserva Legal nas propriedades particulares, a anistia às multas impostas a desmatadores e a flexibilização da produção agropecuária em Áreas de Proteção Permanente (APPs), entre outras.
Lideranças ruralistas como a senadora e presidente da Confederação Nacional de Agricultura (CNA), Kátia Abreu (DEM-TO), e o deputado federal Luiz Carlos Heinze (PP-RS) alegam que a aprovação das mudanças no Código Florestal ainda em 2010 foi acordada antes das eleições com o presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP). Vice-presidente eleito na chapa de Dilma Rousseff, Temer afirma desconhecer o acordo, fato que vem causando entre os ruralistas uma apreensão que só fez crescer depois que o líder do governo na Câmara, Cândido Vacarezza (PT-SP), afirmou que o novo Código somente deverá ser aprovado na próxima legislatura.
Os ruralistas desconfiam que a idéia de jogar a votação sobre o Código Florestal para 2011 é o primeiro passo de uma estratégia para derrotar o relatório de Aldo. A presidente eleita já teria acenado aos ambientalistas do PT e de outros partidos com sua concordância quanto à apresentação de um novo texto, fato comprovado com o anúncio feito na semana passada de que o Ministério do Meio Ambiente (MMA) está elaborando e vai enviar ao Congresso um relatório alternativo ao do deputado comunista.
A ministra Izabella Teixeira, assim como os outros dois comandantes do MMA durante o governo Lula – o deputado estadual Carlos Minc (PT-RJ) e a senadora Marina Silva (PV-AC) – mais de uma vez já manifestaram publicamente seu repúdio às alterações no Código propostas por Aldo. Esse, na opinião de boa parte dos ruralistas, é um outro indicativo da vontade política do futuro governo Dilma no que se refere ao Código Florestal.
Em uma tentativa de garantir a votação do novo Código ainda este ano, o deputado Luiz Carlos Heinze procurou pessoalmente o ministro da Agricultura, Wagner Rossi – também um empresário ligado aos grandes produtores rurais e um político próximo à cúpula do PMDB – e, em particular, ao vice-presidente eleito Michel Temer. “Viemos cobrar o que acertamos com o presidente da Câmara e com o líder do governo antes das eleições, que é a votação do relatório do deputado Aldo Rebelo ainda este ano”, disse Heinze. O ministro Rossi, no entanto, negou ter tratado deste tema com o deputado gaúcho.
Cobranças
Na semana passada, ao participar da Feira Internacional da Cadeia Produtiva do Leite, a senadora Kátia Abreu fez uma cobrança pública a Temer: “Nos acordos políticos não existe papel, existe palavra. Nós confiamos que o presidente da Câmara vai cumprir sua palavra, até mesmo porque ele hoje é o vice-presidente eleito do Brasil”, disse. A presidente da CNA afirmou que os ruralistas “não querem destruir o meio-ambiente” e reclamou que “a questão ambiental no Brasil é conduzida por componentes ideológicos fundamentalistas”.
Kátia Abreu avaliou que o relatório de Aldo “não é o ideal, mas é o possível”, e afirmou contar, mesmo no caso de a votação sobre as mudanças no Código Florestal ser adiada para o ano que vem, com o apoio de Dilma Rousseff: “Quando era ministra e lançou o PAC, Dilma sofreu na pele o exagero da burocracia e do debate ideológico. Tenho certeza de que fará o necessário para o país”, disse a senadora.
Pecuaristas
O Fórum Internacional de Pecuaristas, evento que encerrado na quinta-feira (18) em Uberlândia (MG), transformou-se em foco de pressão dos ruralistas sobre o governo. Grandes produtores rurais como os presidentes da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Cesário Ramalho, e da Associação Brasileira de Criadores de Zebu (ABCZ), Eduardo Biagi, entre outros, defenderam as mudanças no Código Florestal sugeridas por Aldo Rebelo.
O próprio deputado foi uma das estrelas do fórum, onde fez uma palestra. “Estou confiante na aprovação do relatório. Precisamos, sem abrir mão da defesa do meio ambiente, de um Código Florestal que atenda às necessidades do setor produtivo”, disse Rebelo.
De acordo com um estudo recentemente realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, a pecuária é a grande responsável pela crescente ocupação das terras agriculturáveis do Brasil. Segundo o estudo, que usou dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a pecuária ocupa hoje 200 milhões de hectares de um total de 250 milhões de hectares destinados à produção agropecuária em solo brasileiro. Outros 25 milhões de hectares são ocupados pela produção de soja.
Fonte: www.cartacapital.com.br
A bancada ruralista no Congresso Nacional se mobiliza para aprovar ainda na atual legislatura o relatório do deputado Aldo Rebelo, que estabelece mudanças reivindicadas pelo setor
Deixada momentaneamente de lado por conta das eleições presidenciais, a batalha política travada por ruralistas e ambientalistas acerca das mudanças no Código Florestal ressurge com força total. A bancada ruralista no Congresso Nacional se mobiliza para aprovar ainda na atual legislatura o relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que estabelece mudanças no Código reivindicadas pelo setor, como a redução das áreas de Reserva Legal nas propriedades particulares, a anistia às multas impostas a desmatadores e a flexibilização da produção agropecuária em Áreas de Proteção Permanente (APPs), entre outras.
Lideranças ruralistas como a senadora e presidente da Confederação Nacional de Agricultura (CNA), Kátia Abreu (DEM-TO), e o deputado federal Luiz Carlos Heinze (PP-RS) alegam que a aprovação das mudanças no Código Florestal ainda em 2010 foi acordada antes das eleições com o presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP). Vice-presidente eleito na chapa de Dilma Rousseff, Temer afirma desconhecer o acordo, fato que vem causando entre os ruralistas uma apreensão que só fez crescer depois que o líder do governo na Câmara, Cândido Vacarezza (PT-SP), afirmou que o novo Código somente deverá ser aprovado na próxima legislatura.
Os ruralistas desconfiam que a idéia de jogar a votação sobre o Código Florestal para 2011 é o primeiro passo de uma estratégia para derrotar o relatório de Aldo. A presidente eleita já teria acenado aos ambientalistas do PT e de outros partidos com sua concordância quanto à apresentação de um novo texto, fato comprovado com o anúncio feito na semana passada de que o Ministério do Meio Ambiente (MMA) está elaborando e vai enviar ao Congresso um relatório alternativo ao do deputado comunista.
A ministra Izabella Teixeira, assim como os outros dois comandantes do MMA durante o governo Lula – o deputado estadual Carlos Minc (PT-RJ) e a senadora Marina Silva (PV-AC) – mais de uma vez já manifestaram publicamente seu repúdio às alterações no Código propostas por Aldo. Esse, na opinião de boa parte dos ruralistas, é um outro indicativo da vontade política do futuro governo Dilma no que se refere ao Código Florestal.
Em uma tentativa de garantir a votação do novo Código ainda este ano, o deputado Luiz Carlos Heinze procurou pessoalmente o ministro da Agricultura, Wagner Rossi – também um empresário ligado aos grandes produtores rurais e um político próximo à cúpula do PMDB – e, em particular, ao vice-presidente eleito Michel Temer. “Viemos cobrar o que acertamos com o presidente da Câmara e com o líder do governo antes das eleições, que é a votação do relatório do deputado Aldo Rebelo ainda este ano”, disse Heinze. O ministro Rossi, no entanto, negou ter tratado deste tema com o deputado gaúcho.
Cobranças
Na semana passada, ao participar da Feira Internacional da Cadeia Produtiva do Leite, a senadora Kátia Abreu fez uma cobrança pública a Temer: “Nos acordos políticos não existe papel, existe palavra. Nós confiamos que o presidente da Câmara vai cumprir sua palavra, até mesmo porque ele hoje é o vice-presidente eleito do Brasil”, disse. A presidente da CNA afirmou que os ruralistas “não querem destruir o meio-ambiente” e reclamou que “a questão ambiental no Brasil é conduzida por componentes ideológicos fundamentalistas”.
Kátia Abreu avaliou que o relatório de Aldo “não é o ideal, mas é o possível”, e afirmou contar, mesmo no caso de a votação sobre as mudanças no Código Florestal ser adiada para o ano que vem, com o apoio de Dilma Rousseff: “Quando era ministra e lançou o PAC, Dilma sofreu na pele o exagero da burocracia e do debate ideológico. Tenho certeza de que fará o necessário para o país”, disse a senadora.
Pecuaristas
O Fórum Internacional de Pecuaristas, evento que encerrado na quinta-feira (18) em Uberlândia (MG), transformou-se em foco de pressão dos ruralistas sobre o governo. Grandes produtores rurais como os presidentes da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Cesário Ramalho, e da Associação Brasileira de Criadores de Zebu (ABCZ), Eduardo Biagi, entre outros, defenderam as mudanças no Código Florestal sugeridas por Aldo Rebelo.
O próprio deputado foi uma das estrelas do fórum, onde fez uma palestra. “Estou confiante na aprovação do relatório. Precisamos, sem abrir mão da defesa do meio ambiente, de um Código Florestal que atenda às necessidades do setor produtivo”, disse Rebelo.
De acordo com um estudo recentemente realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, a pecuária é a grande responsável pela crescente ocupação das terras agriculturáveis do Brasil. Segundo o estudo, que usou dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a pecuária ocupa hoje 200 milhões de hectares de um total de 250 milhões de hectares destinados à produção agropecuária em solo brasileiro. Outros 25 milhões de hectares são ocupados pela produção de soja.
Fonte: www.cartacapital.com.br
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
Governo Lula deu prioridade a regularização fundiária no Norte
Por Vanessa Ramos
Da Página do MST
A eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, gerou uma enorme expectativa nas organizações e movimentos sociais rurais para a realização da Reforma Agrária. Esperava-se, principalmente, grandes avanços na criação de assentamentos para as famílias Sem Terra.
Em 2003, havia 230 mil famílias acampadas, das quais 150 mil famílias eram organizadas pelo MST. No entanto, o que se viu de lá pra cá indica que o quadro não foi positivo e as dificuldades das famílias embaixo da lona preta se tornam cada dia mais problemáticas.
Segundo Ariovaldo Umbelino, professor titular de Geografia Agrária da Universidade de São Paulo (USP), cerca de 220 mil famílias foram assentadas de fato durante o governo Lula. Apesar disso, o governo divulga que mais de 500 mil famílias tinham sido assentadas.
De acordo com ele, esses dados não correspondiam à realidade porque se soma áreas de regularização fundiária, áreas de reconhecimento de assentamentos antigos e reassentamento de atingidos por barragens como assentamentos novos. Tanto que o MST tem 90 mil famílias acampadas em todas as regiões.
Do ponto de vista de José Batista de Oliveira, da coordenação nacional do MST, o governo Lula não teve um projeto estruturado de Reforma Agrária.
No início do primeiro mandato, houve boas iniciativas, como a elaboração do 2º Plano Nacional de Reforma Agrária. Porém, esse plano não foi cumprido e se perdeu no meio do caminho. “Estamos encerrando o governo e muitas obrigações assumidas não foram executadas”, contou.
“Se fizéssemos uma comparação entre o governo Lula e os anteriores, a avaliação seria positiva. Mas, quando se lê o plano de governo de assentamento, a avaliação é negativa”, afirmou Dr. Rosinha, deputado federal do PT.
“O balanço final mostra que o governo não teria feito cumprir a grande meta que era a Reforma Agrária”, avalia Umbelino.
Além disso, o número de assentados pelo governo Lula se concentra na região Amazônica. Por outro lado, a maioria das famílias acampadas estão nas regiões Sul e Nordeste.
Para Bernardo Mançano Fernandes, professor da Universidade Estadual Paulista (UNESP), assentar famílías no Centro–Sul “significaria enfrentar diretamente o agronegócio. O governo não tem interesse de ir contra o agronegócio e os movimentos sociais não têm força política para esse enfrentamento”.
As áreas destinadas pelo governo aos trabalhadores rurais no Norte do país, de acordo com Umbelino, “foram feitas por conveniência, por que lá, exatamente, o Incra tem um estoque de terras públicas já discriminadas e arrecadadas, o que facilitou o processo”.
Legalização da grilagem
Na prática, a concentração de famílias que entraram em projetos do Incra na Amazônia acabou, na opinião do professor Umbelino, valorizando uma política da legalização da grilagem.
Ele explica que o não cumprimento das metas de Reforma Agrária foi uma decisão deliberada do Incra, uma vez que alguns funcionários corruptos, que cuidam do cadastro do órgão, não só recebem como vão receber dinheiro ilegalmente por ter criado as condições necessárias para facilitar a transferência das terras do Incra ao agronegócio, como acontece no estado do Mato Grosso.
O deputado dr. Rosinha afirma que disponibilidade de terras na Amazônia inflou o número de famílias assentadas pelo governo. "Quando eu falo que justamente ali, numa olhada simples, tem maior quantidade de terras disponíveis quer dizer que, para vistoriar outras áreas, o Incra necessitaria de mais funcionários”, disse.
No final das contas, de acordo com Ariovaldo, vão ser transferidos 67 milhões de hectares de terras públicas do Incra para os grileiros.
“Essa ação, embora tenha respaldo da Medida Provisória 458, é inconstitucional. Por isso, já tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) a inconstitucionalidade dela”. Para ele, essa é a maior dilapidação de patrimônio público que se tem notícia.
Todos esses dados evidenciam que essas terras na Amazônia Legal estão registradas no nome do Incra. “Portanto, não paira sobre elas nenhuma dúvida de que são terras públicas e que são terras, desta forma, segundo a Constituição, destinadas à Reforma Agrária”, explicou Umbelino.
Diante desse cenário, o professor da USP afirma que “em vez de fazer a Reforma Agrária, se adotou uma política de contra Reforma Agrária”. Para ele, todos esses transtornos poderiam ser resolvidos por meio de uma medida simples: vontade política.
Para o professor da USP, mesmo com índice de produtividade de 1985, o Incra tem um total de 120 milhões de hectares de grandes propriedades improdutivas no seu cadastro.
“Se existisse vontade política de fazer Reforma Agrária, o governo poderia usar das ações normais de constatação das terras improdutivas e fazer a desapropriação como manda o Estatuto da Terra e a legislação complementar”, concluiu.
José Batista cobra do próximo governo o fortalecimento do Incra para criar condições para o assentamento das 90 mil famílias acampadas do MST. “É preciso reestruturar o Incra para fazer a Reforma Agrária avançar no Brasil. Mesmo assim, a gente reconhece que em alguns campos houve avanço. Por exemplo: nós não tivemos problema de diálogo com o governo. não houve uma repressão ou marginalização dos movimentos sociais por parte do governo”.
Governo cria fundo de apoio à agricultura familiar no Mercosul
O novo fundo será composto por recursos dos quatro países-membros, mas o Brasil terá a maior parcela de contribuição mínima.
O governo decidiu criar um fundo de apoio à agricultura familiar dentro do Fundo de Reconversão Econômica do Mercosul que permitirá operações de garantia de renda e segurança alimentar em todos os países do bloco.
Com uma nova lei, que tramita na Câmara como projeto de decreto legislativo, os países do Mercosul poderão atuar por meio de projetos e programas de forma bilateral. O Brasil poderá, por exemplo, usar seus estoques estratégicos para auxiliar no abastecimento e na regulação dos mercados agrícolas vizinhos. "Podemos comprar ou vender milho no Paraguai. Ou atuar no mercado de leite do Uruguai adquirindo produto lá e abastecendo o país que tiver problema de escassez", disse o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel. "Desde que beneficie a agricultura familiar, podemos fazer operações desse tipo".
O fundo, que amplia o poder de intervenção do governo em mercados agropecuários, será uma das estrelas da Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar (Reaf), um encontro semestral realizado pelo Mercosul desde 2004. "É a primeira experiência regional de uma política pública comum", diz Cassel. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva estará presente hoje na abertura do evento.
O público beneficiado no Mercosul é abrangente. O bloco comercial tem cerca de 4,9 milhões de estabelecimentos rurais espalhados por 120 milhões de hectares - 83% das fazendas são tipicamente familiares. "Eles produzem 70% dos alimentos básicos da população da região", diz o ministro.
O novo fundo será composto por recursos dos quatro países-membros. Mas o Brasil terá a maior parcela de contribuição mínima, com 70% do total - ou US$ 225 mil dos US$ 360 mil previstos anualmente. A Argentina entrará com US$ 96 mil (27%). O Uruguai bancará US$ 21 mil (2%) e o Paraguai, US$ 18 mil (1%). mas estão previstas integralizações complementares de membros e de terceiros países. Com isso, estima o ministério, o fundo poderia somar R$ 100 milhões ao longo de uma década.
A meta do novo fundo é atuar nos mercados locais para estimular a produção regional agropecuária. No Haiti, por exemplo, o Brasil enviou recursos financeiros para a aquisição da produção da agricultura familiar pelo governo local. "Em vez de mandar doações, que derrubariam ainda mais os preços internos, mandamos doação em dinheiro ao governo do Haiti", lembra Cassel. O crédito pela forma engenhosa de atuação, segundo ele, é do chamado "GT Fome", coordenado pelo Itamaraty.
O encontro da Reaf também apresentará um balanço dos principais programas e projetos criados pelo governo brasileiro a dirigentes de países vizinhos e africanos. Um dos maiores trunfos, cujo modelo tem sido avalizado pela FAO - Agência para Agricultura e Alimentação da Organização das Nações Unidos, é o financiamento da aquisição de máquinas e equipamentos agrícolas a produtores familiares. Até novembro, o chamado programa "Mais Alimentos" ajudou na comercialização de 35 mil tratores, mais de 1 mil caminhões - somente a Volkswagen soma 500 unidades -, além de outros 30 mil contratos à bovinocultura para aquisição de matrizes, máquinas e equipamentos. Os destaques foram as vendas de 10 mil tanques resfriadores de leite.
"Esse programa reduziu em 17,5% os preços das máquinas e dos equipamentos", diz o ministro. A linha financia a juros de 2% ao ano e dá prazo de 15 anos para pagar, com carência de três. Agora, esse crédito será estendido a países da África. Cada operação terá teto de R$ 150 milhões por país. O Banco do Brasil será responsável pelos contratos com bancos locais e regionais de fomento na África.
A política de compras governamentais diretas da agricultura familiar (PAA) também tem sido replicada em outros países. De 2004 a 2009, foram aplicados R$ 2,4 bilhões do governo nessas aquisições, o que beneficiou 113 mil famílias.
Fonte: Valor Econômico
O governo decidiu criar um fundo de apoio à agricultura familiar dentro do Fundo de Reconversão Econômica do Mercosul que permitirá operações de garantia de renda e segurança alimentar em todos os países do bloco.
Com uma nova lei, que tramita na Câmara como projeto de decreto legislativo, os países do Mercosul poderão atuar por meio de projetos e programas de forma bilateral. O Brasil poderá, por exemplo, usar seus estoques estratégicos para auxiliar no abastecimento e na regulação dos mercados agrícolas vizinhos. "Podemos comprar ou vender milho no Paraguai. Ou atuar no mercado de leite do Uruguai adquirindo produto lá e abastecendo o país que tiver problema de escassez", disse o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel. "Desde que beneficie a agricultura familiar, podemos fazer operações desse tipo".
O fundo, que amplia o poder de intervenção do governo em mercados agropecuários, será uma das estrelas da Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar (Reaf), um encontro semestral realizado pelo Mercosul desde 2004. "É a primeira experiência regional de uma política pública comum", diz Cassel. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva estará presente hoje na abertura do evento.
O público beneficiado no Mercosul é abrangente. O bloco comercial tem cerca de 4,9 milhões de estabelecimentos rurais espalhados por 120 milhões de hectares - 83% das fazendas são tipicamente familiares. "Eles produzem 70% dos alimentos básicos da população da região", diz o ministro.
O novo fundo será composto por recursos dos quatro países-membros. Mas o Brasil terá a maior parcela de contribuição mínima, com 70% do total - ou US$ 225 mil dos US$ 360 mil previstos anualmente. A Argentina entrará com US$ 96 mil (27%). O Uruguai bancará US$ 21 mil (2%) e o Paraguai, US$ 18 mil (1%). mas estão previstas integralizações complementares de membros e de terceiros países. Com isso, estima o ministério, o fundo poderia somar R$ 100 milhões ao longo de uma década.
A meta do novo fundo é atuar nos mercados locais para estimular a produção regional agropecuária. No Haiti, por exemplo, o Brasil enviou recursos financeiros para a aquisição da produção da agricultura familiar pelo governo local. "Em vez de mandar doações, que derrubariam ainda mais os preços internos, mandamos doação em dinheiro ao governo do Haiti", lembra Cassel. O crédito pela forma engenhosa de atuação, segundo ele, é do chamado "GT Fome", coordenado pelo Itamaraty.
O encontro da Reaf também apresentará um balanço dos principais programas e projetos criados pelo governo brasileiro a dirigentes de países vizinhos e africanos. Um dos maiores trunfos, cujo modelo tem sido avalizado pela FAO - Agência para Agricultura e Alimentação da Organização das Nações Unidos, é o financiamento da aquisição de máquinas e equipamentos agrícolas a produtores familiares. Até novembro, o chamado programa "Mais Alimentos" ajudou na comercialização de 35 mil tratores, mais de 1 mil caminhões - somente a Volkswagen soma 500 unidades -, além de outros 30 mil contratos à bovinocultura para aquisição de matrizes, máquinas e equipamentos. Os destaques foram as vendas de 10 mil tanques resfriadores de leite.
"Esse programa reduziu em 17,5% os preços das máquinas e dos equipamentos", diz o ministro. A linha financia a juros de 2% ao ano e dá prazo de 15 anos para pagar, com carência de três. Agora, esse crédito será estendido a países da África. Cada operação terá teto de R$ 150 milhões por país. O Banco do Brasil será responsável pelos contratos com bancos locais e regionais de fomento na África.
A política de compras governamentais diretas da agricultura familiar (PAA) também tem sido replicada em outros países. De 2004 a 2009, foram aplicados R$ 2,4 bilhões do governo nessas aquisições, o que beneficiou 113 mil famílias.
Fonte: Valor Econômico
Alimentos subirão ainda mais em 2011, prevê FAO
A fatura passará de US$ 1 trilhão para os importadores e, nesse cenário, os produtores brasileiros poderão ser um dos principais ganhadores. A FAO estima que o país poderá exportar volumes recordes de açúcar e embarques quase recordes de carne e oleaginosas.
"O lado negativo é que o real valorizado em relação ao dólar pode minar os benefícios completos de maior ganho nas exportações", diz Adam Prakash, assessor de preços da agência da ONU. "E preços mais altos podem diminuir a demanda global no futuro". Além disso, o temor de inflação ocorre tanto na China, Índia e outros emergentes, como também no Brasil.
A fatura mundial de importações alimentares aumentará 15% em relação a 2009. O custo ficará quase idêntico ao volume de US$ 1,031 trilhão ocorrido durante a explosão de preços de 2008.
O encarecimento da maioria dos produtos agrícolas é causado por insuficiência de oferta por problemas meteorológicos, dólar fraco e agravado pela restrição a exportação de grandes produtores como a Rússia e a Ucrânia.
O açúcar, que tem o Brasil como maior produtor e exportador, é em grande parte responsável pela alta na cesta mundial de alimentos nos últimos meses. Sua cotação atingiu o mais alto nível em 30 anos, devendo continuar elevada e "extremamente volátil".
"Os preços mundiais podem aumentar ainda mais se a produção não melhorar significativamente no ano que vem, em particular para soja, milho e trigo", diz a FAO.
"É improvável que os efeitos de preços mais altos sejam contidos em seus respectivos setores, na medida em que essas commodities constituem ingredientes para pecuária ou para o setor de bicombustíveis", acrescenta. "Com os preços refletindo largamente a escassez na exportação, a concorrência global para assegurar matérias-primas deve se intensificar".
No caso de oleaginosas, os preços elevados refletem um crescimento relativamente lento da produção mundial que não consegue satisfazer a demanda em rápida expansão.
O custo de produtos da pecuária, especialmente lácteos, elevará a fatura dos importadores em US$ 50 bilhões este ano. O preço de manteiga chegou a um nível sem precedentes. Até a mandioca bateu recorde de custo este ano, com a produção recuando pela primeira vez em 15 anos.
Os gastos com importação de legumes e frutas devem subir US$ 25 bilhões, estabelecendo esse grupo de produtos entre os mais caros na cesta global de comercialização de alimentos. Os peixes também terão importantes altas de preços.
Contrariamente às previsões de junho que apontavam progressão de 1,2% na produção mundial de cereais, a FAO prevê queda de 2%, por causa de condições meteorológicas "nefastas". Os estoques mundiais devem diminuir 7%.
A produção de grãos brutos, incluindo milho e cevada, deve baixar 2,1% e os estoques, 12%. A produção de arroz aumenta 2,4%, para um recorde de 466 milhões de toneladas, e as reservas sobem 6%. A produção de oleaginosas cai 0,3% em 2010/11, caindo do recorde de 454,8 milhões de toneladas na safra passada.
A produção de açúcar aumentará 7,7% em 2010/11, para 168,8 milhões de toneladas. Os preços elevados impulsionaram aumento da produção, que vai superar pela primeira vez o consumo desde 2007/08.
A produção das principais cereais precisa crescer muito para responder às necessidades de utilização e reconstituição das reservas mundiais. Mas a FAO adverte que os agricultores poderão ser atraídos por colheitas com melhores preços como açúcar, soja e algodão.
Ou seja, a produção não será suficiente para atenuar as tensões no mercado e o consumidor "deverá gastar mais por sua alimentação".
Pela primeira vez, o relatório é bem pessimista. Até agora, a FAO atenuava a gravidade da alta de preços e estimava mesmo que as cotações cairiam no ano que vem.
fonte: Valor Online
"O lado negativo é que o real valorizado em relação ao dólar pode minar os benefícios completos de maior ganho nas exportações", diz Adam Prakash, assessor de preços da agência da ONU. "E preços mais altos podem diminuir a demanda global no futuro". Além disso, o temor de inflação ocorre tanto na China, Índia e outros emergentes, como também no Brasil.
A fatura mundial de importações alimentares aumentará 15% em relação a 2009. O custo ficará quase idêntico ao volume de US$ 1,031 trilhão ocorrido durante a explosão de preços de 2008.
O encarecimento da maioria dos produtos agrícolas é causado por insuficiência de oferta por problemas meteorológicos, dólar fraco e agravado pela restrição a exportação de grandes produtores como a Rússia e a Ucrânia.
O açúcar, que tem o Brasil como maior produtor e exportador, é em grande parte responsável pela alta na cesta mundial de alimentos nos últimos meses. Sua cotação atingiu o mais alto nível em 30 anos, devendo continuar elevada e "extremamente volátil".
"Os preços mundiais podem aumentar ainda mais se a produção não melhorar significativamente no ano que vem, em particular para soja, milho e trigo", diz a FAO.
"É improvável que os efeitos de preços mais altos sejam contidos em seus respectivos setores, na medida em que essas commodities constituem ingredientes para pecuária ou para o setor de bicombustíveis", acrescenta. "Com os preços refletindo largamente a escassez na exportação, a concorrência global para assegurar matérias-primas deve se intensificar".
No caso de oleaginosas, os preços elevados refletem um crescimento relativamente lento da produção mundial que não consegue satisfazer a demanda em rápida expansão.
O custo de produtos da pecuária, especialmente lácteos, elevará a fatura dos importadores em US$ 50 bilhões este ano. O preço de manteiga chegou a um nível sem precedentes. Até a mandioca bateu recorde de custo este ano, com a produção recuando pela primeira vez em 15 anos.
Os gastos com importação de legumes e frutas devem subir US$ 25 bilhões, estabelecendo esse grupo de produtos entre os mais caros na cesta global de comercialização de alimentos. Os peixes também terão importantes altas de preços.
Contrariamente às previsões de junho que apontavam progressão de 1,2% na produção mundial de cereais, a FAO prevê queda de 2%, por causa de condições meteorológicas "nefastas". Os estoques mundiais devem diminuir 7%.
A produção de grãos brutos, incluindo milho e cevada, deve baixar 2,1% e os estoques, 12%. A produção de arroz aumenta 2,4%, para um recorde de 466 milhões de toneladas, e as reservas sobem 6%. A produção de oleaginosas cai 0,3% em 2010/11, caindo do recorde de 454,8 milhões de toneladas na safra passada.
A produção de açúcar aumentará 7,7% em 2010/11, para 168,8 milhões de toneladas. Os preços elevados impulsionaram aumento da produção, que vai superar pela primeira vez o consumo desde 2007/08.
A produção das principais cereais precisa crescer muito para responder às necessidades de utilização e reconstituição das reservas mundiais. Mas a FAO adverte que os agricultores poderão ser atraídos por colheitas com melhores preços como açúcar, soja e algodão.
Ou seja, a produção não será suficiente para atenuar as tensões no mercado e o consumidor "deverá gastar mais por sua alimentação".
Pela primeira vez, o relatório é bem pessimista. Até agora, a FAO atenuava a gravidade da alta de preços e estimava mesmo que as cotações cairiam no ano que vem.
fonte: Valor Online
terça-feira, 16 de novembro de 2010
A bússola de uma nova rota
José Graziano da Silva,
Valor Econômico, 16/11/2010
Miséria e fome estão de tal forma interligadas na engrenagem da exclusão mundial que figuram como desafios gêmeos do primeiro Objetivo de Desenvolvimento do Milênio, que tem como meta reduzi-las à metade até 2015. Se a fome pode e deve ter precedência nesse mutirão, pois é uma das principais causas da pobreza, a erradicação da miséria pressupõe ampla gama de iniciativas, voltadas à inserção de quem vive à margem da oferta e da demanda. Tal abrangência redunda em obstáculo adicional a inúmeros governos em todo o mundo que carecem de fôlego fiscal e aparato público compatíveis para uma atuação simultânea em tantas frentes.
A necessidade de eleger prioridades no mundo pobre é incontornável e a FAO considera o fortalecimento da agricultura - em especial da familiar - a mais promissora das escolhas: 85% das propriedades agrícolas do planeta têm área inferior a dois hectares; pequenos produtores e suas famílias somam 2 bilhões de pessoas ou um terço da humanidade; e vivem e trabalham no campo 70% daqueles que passam fome no mundo.
De vários países chegam evidencias de que essa percepção deixou de ser um truísmo para se tornar uma agenda compartilhada por governos que abraçaram a segurança alimentar como responsabilidade do Estado, independente das promessas de ajuda internacional.
Tripé de sucesso: alta taxa de crescimento, segurança alimentar e apoio à agricultura familiar
A exemplo do Brasil, países como Armênia, Nigéria e Vietnã anteciparam-se às metas de redução da fome e da pobreza fixadas para 2015. O documento da FAO "Caminhos para o sucesso" - que encontra-se disponível no site www.rlc.fao.org/pr/pubs/pdf/pathways.pdf - destaca que esses países exibem um tripé composto de elevadas taxas de crescimento associadas a políticas de segurança alimentar e apoio à agricultura familiar.
O Vietnã reduziu em 40% o contingente de subnutridos, em 50% a pobreza extrema, e passa por uma impressionante transformação rural. De certo modo, o país encontra-se um passo à frente daquilo que o programa Territórios da Cidadania persegue no Brasil. Além do apoio técnico à produção, 84% das áreas de várzea foram irrigadas; 93% das comunas ganharam estradas de acesso; 70% delas tem eletricidade; 98%, escolas primárias; 92%, centros de saúde; e, 40%, possui água potável.
Na Nigéria, há mais boas notícias. Uma robusta política de investimento na agricultura familiar ajuda a explicar o êxito do país no combate à fome. Ênfases e resultados semelhantes ajudam a entender o mesmo desempenho na Armênia, cujos planos futuros incluem a melhoria de sua infraestrutura hídrica para reduzir as perdas de água, investimentos no desenvolvimento rural para diminuir a brecha com as zonas urbanas e a proteção da biodiversidade.
Casos de êxito também podem ser apontados na Argélia, Maláui e Turquia, que, como o Brasil, souberam romper a inércia latifundiária do passado e promover uma ampla transformação produtiva no setor agrícola.
Na Indonésia, México e Serra Leoa, o fortalecimento das comunidades rurais pobres permitiu melhorar a produtividade dos empreendimentos de pequena escala.
No Brasil, o pulo do gato foi escapar da armadilha que contrapõe o crescimento econômico e a ação social. O país entendeu que qualquer política social resultaria em assistencialismo se não fosse acompanhada de linhas de passagem focadas no crescimento inclusivo, atendendo a emergência e ao mesmo tempo que aciona medidas que favorecem a emancipação produtiva dos segmentos mais pobres.
Ao harmonizar essas duas vias numa mesma dinâmica de crescimento, conforme preconiza o enfoque de duas vias proposto pela FAO e adotado pelo Fome Zero, o Brasil abriu caminho para um largo horizonte de desenvolvimento. Um piso de sobrevivência pavimentou a vida de 12,4 milhões de lares mais pobres beneficiados pelo Bolsa Família. O salário mínimo teve seu poder de compra corrigido em mais de 70%. Em oito anos, cerca de 24 milhões de pessoas superaram a linha da pobreza. Um amplo leque de fomento deu peso e medida à agricultura familiar reposicionando seu espaço na economia e irradiando desdobramentos benignos no interior da sociedade.
Esse conjunto mostrou-se superior à soma das partes. O mercado de massa brasileiro reúne hoje mais de 50% da população e 46% da renda. Tornou-se uma usina germinadora de renda e inclusão, tendo criado cerca de 15 milhões de empregos formais em oito anos.
Agora, a presidente eleita Dilma Rousseff quer agora dobrar a aposta e erradicar a pobreza extrema. A meta é factível. O mais importante do ponto de vista internacional, porém, é que o Brasil consagrou a supremacia da lógica social na condução das políticas de um desenvolvimento inclusivo e isso terá um efeito irradiador importante na agenda de combate à fome e à pobreza, sobretudo na região da América Latina e no Caribe.
Esperar a maré subir para colocar o barco dos pobres na água tornou-se uma hipótese temerária ante o agravamento do quadro econômico mundial. Mais que nunca, navegar é preciso e os exemplos citados demonstram o acerto de iniciar a pescaria por conta própria. A bússola de uma redução substantiva da fome e da pobreza baliza o percurso dessa nova rota feita de menor dependência e maior inclusão.
José Graziano da Silva é representante Regional da FAO para América Latina e Caribe
sexta-feira, 12 de novembro de 2010
Até tu, Marina? Até tu, Chico Mendes? Até tu, Aziz?
(Ilustração: Gabriel Daher)
Rui Daher
De São Paulo (SP) para Terra Magazine
Desde abril deste ano, o senhor Wagner Rossi é ministro da Agricultura. Substituiu a Reinhold Stephanes, candidato (PMDB-PR) à reeleição para a Câmara dos Deputados. Rossi também fez carreira política no PMDB e passou por cinco legislaturas.
Paulista de Ribeirão Preto (SP), na gestão anterior foi presidente da CONAB. É formado em Direito pela USP, pós-doutorado nos EUA, professor universitário, empresário e produtor rural por mais de 30 anos. Conquistas que devem orgulhá-lo.
Em artigo para o "Valor", de 11/8, ele defende o novo Código Florestal (CF), ainda não sancionado. Antes, enaltece "a preservação dos recursos naturais, o respeito pelo ambiente, a defesa da biodiversidade". Faz-nos felizes.
Quando chega à alimentação, é para dizer que "comida é vida, é sobrevivência, é combustível para existir. (...) Sem ela, não chegamos a qualquer outra atividade humana". Deixa-nos aliviados.
Desnecessário ir mais longe. O leitor inteligente já percebeu o corolário que se aproxima a passos lentos, quase pisando em ovos, e chega com uma mensagem poética: "São os produtores rurais que, no amaino cotidiano da terra, cuidam da natureza".
Não duvido, suponho até que muitos o façam, mas penso: quem, então, nas últimas décadas, apesar de um CF ferrenho, teria provocado tanta devastação ambiental?
O próprio Rossi nos dá a pista. "Pessoas que não conhecem a realidade da vida no campo (...) e por mais bem intencionadas que possam ser, estabelecem limites que oneram um setor produtivo que já enfrenta dificuldades para continuar a garantir alimento ao povo brasileiro".
Mais uma vez, o leitor perspicaz já identificou o alvo do ministro.
Sabemos que, à exceção de algumas situações pontuais que justificam adaptações no código atual, como o tratamento regionalizado dos biomas, há condições plenas de se aumentar a produção agrícola preservando as regras ambientais de hoje.
Assim pensam insuspeitos críticos do novo Código.
Aziz Nacib Ab'Saber, por exemplo, geógrafo e professor aposentado da USP, laureado mundialmente e referência em assuntos ligados aos impactos ambientais, aos 85 anos, não merece estar no rol de inocentes úteis. O mesmo pode-se dizer daqueles que dão título a esta coluna. Em palestra apresentada no último congresso da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, o geógrafo alerta para uma futura hecatombe.
Critica o desconhecimento de quem conduziu a reforma. Mostra os riscos de estadualizar "questões referentes à progressividade do desmatamento que exigem ações conjuntas de órgãos federais específicos (...) uma Polícia Federal rural, e o Exército Brasileiro".
Sugere o correto, que sempre esteve para ser feito e nunca o foi: "Focar para o zoneamento físico e ecológico de todos os domínios de natureza do país".
Aziz insiste que, antes de se mudar o CF, sem um estudo mais aprofundado, é necessário ampliar sua abrangência até um Código de Biodiversidade. Ideia que remetida a Brasília voltou com a pecha de complexa e inoportuna.
Ah, Brasília, quando os senhores conseguirão entender que complexa é a estrutura geomorfológica do país e inoportuna a interessada intervenção de Vossas Excelências?
O que Aziz e muitos inocentes que o seguem querem é informar que temos "duas principais faixas de florestas tropicais brasileiras (a amazônica e a das matas atlânticas), o domínio dos cerrados (...) a região semiárida dos sertões nordestinos, os planaltos de araucárias e as pradarias mistas do Rio Grande do Sul, além do litoral e do Pantanal mato-grossense". Cada um com mosaicos vegetais específicos.
Deveríamos ouvi-los.
Rui Daher é administrador de empresas, consultor da Biocampo Desenvolvimento Agrícola.
“Educação do campo sai do anonimato com regulamentação", afirma Sem Terra
Vanderlucia Oliveira, do MST, cumprimenta o presidente Lula durante a cerimônia
Por Mayrá Lima
Da Página do MST
O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, assinou nesta quinta-feira (4/11), um decreto que transforma a educação do campo em política pública.
“O decreto vai possibilitar que a educação do campo saia do anonimato”, avalia Vanderlucia Oliveira, da coordenação do MST e da Via Campesina Brasil.
Vanderlucia, assentada no estado do Ceará, é uma das beneficiadas pelo programa.
Leia o decreto que regulamenta o Pronera
A oportunidade de fazer o mestrado acadêmico dentro da Universidade de Brasília veio após a formação dentro dos cursos do Pronera.
“Acabamos de regulamentar uma forma de educação participativa e colaborativa que contribui com a formação da identidade camponesa”, completou.
A solenidade contou com a participação dos ministro da Educação Fernando Haddad, do ministro interino do Desenvolvimento Agrário Daniel Maia e de integrantes da Via Campesina e outros movimentos sociais do campo.
Dentre os programas regulamentados, destaca-se o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera).
O programa beneficiou mais de 400 mil trabalhadores rurais, jovens e adultos assentados, seja na alfabetização, ou na formação em cursos de graduação e pós-graduação.
A partir de agora, o governo federal tem a responsabilidade de criar e implementar mecanismos que assegurem a manutenção e o desenvolvimento da educação na área rural.
Dessa forma, terá que colocar em curso medidas para superar a falta de acesso às escolas e enfrentamento de problemas estruturais como o fomento à educação básica, fornecimento de energia elétrica, água potável e saneamento básico.
Ações de inclusão digital também estão previstos no decreto.
Além disso, o documento regulamenta o calendário escolar de acordo com as particularidades das atividades regionais e dos ciclos produtivos; o reconhecimento da relevância da escola multisseriada, que se caracteriza por turmas de alunos de diferentes idades e graus de conhecimento na mesma sala e com um único professor; e a pedagogia da alternância (combina atividades intensivas na sala de aula com práticas na propriedade).
Para receber assistência técnica e as transferências voluntárias de recursos do governo federal, o decreto orienta estados e municípios a incluir a educação no campo nos seus planos estaduais e municipais de educação.
Os planos de que trata o decreto devem ser construídos a partir do Plano Nacional de Educação (PNE), que o governo federal vai encaminhar ao Congresso Nacional. O PNE vai trazer as metas educacionais a serem alcançadas pelo Brasil no período de 2011 a 2020.
Governo prepara projeto alternativo ao novo Código Florestal
É grande a expectativa quanto à apresentação do Projeto de Lei do governo que substitui o Código Florestal, de 1965. A previsão é que a proposta fique pronta ainda nesta semana, mas deverá ser enviada ao Congresso somente no próximo ano. O objetivo é evitar desgaste político nos últimos dias do governo Lula.
O Projeto do governo é uma alternativa ao novo Código Florestal, aprovado no início de julho por uma comissão especial da Câmara dos Deputados. Criticado por ambientalistas e organizações sociais, o novo Código teve como relator o deputado federal Aldo Rebelo (PC do B) e aguarda votação nos plenários da Câmara e do Senado.
Uma dos pontos mais polêmicos da proposta de Aldo é a possibilidade de anulação das multas aplicadas em produtores rurais que desmataram reservas ambientais no período anterior a julho de 2008. Eles não estariam mais obrigados a recuperar as áreas degradadas.
O Código também reduz de 30 para 15 metros a área de vegetação que deve ser preservada na margem de rios. A criação de planos de regularização ambiental, no prazo de cinco anos, ficaria sob responsabilidade dos estados. O governo alega que as propostas de Aldo incentivam o desmatamento e prejudicam compromissos assumidos pelo Brasil, como as metas de redução dos gases de efeito estufa.
De São Paulo, da Radioagência NP, Jorge Américo.
O Projeto do governo é uma alternativa ao novo Código Florestal, aprovado no início de julho por uma comissão especial da Câmara dos Deputados. Criticado por ambientalistas e organizações sociais, o novo Código teve como relator o deputado federal Aldo Rebelo (PC do B) e aguarda votação nos plenários da Câmara e do Senado.
Uma dos pontos mais polêmicos da proposta de Aldo é a possibilidade de anulação das multas aplicadas em produtores rurais que desmataram reservas ambientais no período anterior a julho de 2008. Eles não estariam mais obrigados a recuperar as áreas degradadas.
O Código também reduz de 30 para 15 metros a área de vegetação que deve ser preservada na margem de rios. A criação de planos de regularização ambiental, no prazo de cinco anos, ficaria sob responsabilidade dos estados. O governo alega que as propostas de Aldo incentivam o desmatamento e prejudicam compromissos assumidos pelo Brasil, como as metas de redução dos gases de efeito estufa.
De São Paulo, da Radioagência NP, Jorge Américo.
Campanha de Doação de Brinquedos no Natal
O NATAL está chegando!!!
Época que nos faz sentir emoções diversas, como alegria, solidariedade, paz.
Infelizmente, nem todas as famílias podem oferecer aos seus filhos e filhas brinquedos e presentes.
E em solidariedade às famílias acampadas, que mesmo em precária situação lutam diariamente por condições de vida digna, pela Reforma Agrária, pela Agricultura Familiar e pelo Desenvolvimento Rural Sustentável é que foi criada uma CAMPANHA DE DOAÇÃO DE BRINQUEDOS, organizada pela ASSEMDA (Associação Nacional dos Servidores do MDA), ASSERA (Associação dos Servidores da Reforma Agrária em Brasília) e CNASI (Confederação Nacional dos Servidores do INCRA).
Pedimos a todas as pessoas do MDA e do INCRA que sejam solidárias e participem desta campanha através da doação de brinquedos em bom estado de conservação.
Os brinquedos serão entregues aos Sem Terrinhas dos acampamentos “Eldorado dos Carajás” (Unaí) e “Graziela” (DF).
A entrega ocorrerá no dia 16 de dezembro, e organizaremos um ônibus até o local. Carregando servidores, consultores, terceirizados, familiares para efetuarmos a entrega dos brinquedos e também confraternizarmos com as crianças.
Os interessados em participar da entrega devem deixar seus nomes na ASSERA (14º andar do Edifício Palácio do Desenvolvimento) ou manifestar o interesse pela lista.
Locais de arrecadação de brinquedos: Térreo, 14º (Hall), 7º (MDA), NEAD, MDA/Esplanada, SR-28 e Terra Legal.
Vamos participar turma!!!!
Época que nos faz sentir emoções diversas, como alegria, solidariedade, paz.
Infelizmente, nem todas as famílias podem oferecer aos seus filhos e filhas brinquedos e presentes.
E em solidariedade às famílias acampadas, que mesmo em precária situação lutam diariamente por condições de vida digna, pela Reforma Agrária, pela Agricultura Familiar e pelo Desenvolvimento Rural Sustentável é que foi criada uma CAMPANHA DE DOAÇÃO DE BRINQUEDOS, organizada pela ASSEMDA (Associação Nacional dos Servidores do MDA), ASSERA (Associação dos Servidores da Reforma Agrária em Brasília) e CNASI (Confederação Nacional dos Servidores do INCRA).
Pedimos a todas as pessoas do MDA e do INCRA que sejam solidárias e participem desta campanha através da doação de brinquedos em bom estado de conservação.
Os brinquedos serão entregues aos Sem Terrinhas dos acampamentos “Eldorado dos Carajás” (Unaí) e “Graziela” (DF).
A entrega ocorrerá no dia 16 de dezembro, e organizaremos um ônibus até o local. Carregando servidores, consultores, terceirizados, familiares para efetuarmos a entrega dos brinquedos e também confraternizarmos com as crianças.
Os interessados em participar da entrega devem deixar seus nomes na ASSERA (14º andar do Edifício Palácio do Desenvolvimento) ou manifestar o interesse pela lista.
Locais de arrecadação de brinquedos: Térreo, 14º (Hall), 7º (MDA), NEAD, MDA/Esplanada, SR-28 e Terra Legal.
Vamos participar turma!!!!
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Agricultura familiar impediu crise dos alimentos
Após analisar os dados dos Censos Agropecuários do IBGE de 1996 e 2006, a professora da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Resemeire Aparecida de Almeida, contesta a eficiência do agronegócio. De acordo com suas análises, no Paraná e no Mato Grosso do Sul, o agronegócio está se apropriando das melhores terras, o que provocou um recuo das áreas destinadas ao plantio de arroz e feijão. Ela concluiu que a agricultura familiar impediu uma crise no abastecimento de alimento.
“64% dessa produção veio das pequenas unidades de produção, tanto no Mato Grosso do Sul quanto no Paraná. Enfim, a gente pode dizer com muita segurança que as pequenas propriedades são responsáveis, de forma geral, pela comida que está na mesa dos brasileiros.”
Rosemeire cita o exemplo a cidade de Santa Rita do Pardo, no Mato Grosso do Sul. No local, onde as propriedades são todas acima de dois mil hectares, predominam o desemprego e as condições precárias de vida. A situação facilita a chegada de empresas e a introdução dos monocultivos.
“O agronegócio da celulose elegeu a região leste do Mato Grosso do Sul por questões logísticas. Dentre elas, essa ociosidade das terras. Portanto, reforça aquele discurso de que vieram para gerar emprego, para recuperar as áreas degradadas. O pressuposto é sempre partindo do pior.”
As propriedades com mais de dois mil hesctares conseguiram um financiamento de mais de R$ 1 bilhão e geraram um valor de produção pouco maior que R$ 500 milhões. Já as propriedades menores que 50 hectares multiplicaram por 20 um crédito de R$ 2,4 milhões.
De São Paulo, da Radioagência NP, Jorge Américo.
“64% dessa produção veio das pequenas unidades de produção, tanto no Mato Grosso do Sul quanto no Paraná. Enfim, a gente pode dizer com muita segurança que as pequenas propriedades são responsáveis, de forma geral, pela comida que está na mesa dos brasileiros.”
Rosemeire cita o exemplo a cidade de Santa Rita do Pardo, no Mato Grosso do Sul. No local, onde as propriedades são todas acima de dois mil hectares, predominam o desemprego e as condições precárias de vida. A situação facilita a chegada de empresas e a introdução dos monocultivos.
“O agronegócio da celulose elegeu a região leste do Mato Grosso do Sul por questões logísticas. Dentre elas, essa ociosidade das terras. Portanto, reforça aquele discurso de que vieram para gerar emprego, para recuperar as áreas degradadas. O pressuposto é sempre partindo do pior.”
As propriedades com mais de dois mil hesctares conseguiram um financiamento de mais de R$ 1 bilhão e geraram um valor de produção pouco maior que R$ 500 milhões. Já as propriedades menores que 50 hectares multiplicaram por 20 um crédito de R$ 2,4 milhões.
De São Paulo, da Radioagência NP, Jorge Américo.
Competência do agronegócio é um mito
Pesquisa revela dados que colocam em xeque a suposta maravilha do setor
Comissão Pastoral da Terra
Mato Grosso do Sul
Uma pesquisa realizada pela doutora Rosemeire Aparecida de Almeida, docente da graduação e pós graduação em geografia da UFMS/Campus de Três Lagoas, revela dados que colocam em xeque a suposta maravilha do agronegócio em Mato Grosso do Sul. A pesquisadora demonstra com clareza, números e porcentagens as flagrantes contradições que o mesmo possui; e questiona a suposta capacidade do agronegócio em relação à produtividade e geração de ocupações no campo. E ainda desnuda sua total ineficiência no uso do expressivo volume de recursos que recebe do Estado em financiamento. O setor, que recheia na mídia propagandas de eficiência, perde em eficácia para a pequena unidade de produção que multiplicou por 20 o que recebeu de financiamento, no período em que foi realizada a pesquisa, já o agronegócio dividiu por dois a “ajuda” recebida. A Comissão Pastoral da Terra, Regional Mato Grosso do Sul, conversou com a profissional. Confira abaixo a entrevista:
A professora é do conceito de que o Agronegócio, sobretudo aqui no Mato Grosso do Sul, é incompetente, segundo uma pesquisa sua. Pode citar os elementos principais em que se baseia para sustentar isso?
Recentemente, coordenei pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul/UFMS, com recursos do CNPq e Fundect/MS, pesquisa referente a análise e comparação das transformações territoriais nos Estados de Mato Grosso do Sul e Paraná por meio do estudo dos Censos Agropecuários do IBGE (1995/96 e 2006).
O estudo comparativo destes Estados se justifica pela reconhecida diferença agrária existente em termos de malha fundiária, utilização das terras, mudanças tecnológicas, geração de emprego e renda.
De forma geral, a análise das amostras confirma as hipóteses de que a desconcentração da propriedade é motor de dinamismo no espaço rural e urbano, expresso na maior capacidade de geração de riquezas e pessoal ocupado.
Por exemplo, destacamos que apesar do rebanho bovino do Norte Central paranaense ser cinco vezes menor em relação à região Leste de Mato Grosso do Sul, a quantidade produzida de leite é superior. No entanto, uma simetria permanece, qual seja: nas duas regiões é a pequena unidade que responde pela maior produção de leite. Na região Leste, 42,68% do leite produzido provém dos estabelecimentos de menos de 100 ha e 76,93%, na região Norte Central paranaense.
A respeito dos valores da produção, verificamos que na região Leste do MS as classes de área de menos de 50 hectares foram responsáveis por 5,89% do valor total produzido; já a classe de área com mais de 1000 hectares, por 71,98%.
Porém, ao cruzar estes dados com o valor dos financiamentos obtidos, observamos que a eficiência da pequena unidade é maior. Dito de outra forma, a classe de área de mais de 1000 hectares obteve financiamento de mais de 1 bilhão de reais e gerou um valor de produção total de 524 milhões; a pequena unidade de produção de menos de 50 ha acessou 2,4 milhões (0,21% do valor total dos financiamentos obtidos) e gerou um valor de produção total de 42,9 milhões.
Ou seja, a classe de área de menos de 50 hectares multiplicou por 20 o valor do financiamento e a grande dividiu por dois o valor do financiamento. Portanto, a grande unidade de produção produziu metade do valor que tomou de recursos públicos.
Temos informações importantes também para o Estado na leitura dos dados dos dois últimos censos agropecuários (1995/96 e 2006). A partir da comparação de quatro produtos da lavoura temporária, sendo dois que fazem parte principalmente da agricultura de exportação, e dois que são componentes principais do consumo popular dos brasileiros, em que verificamos que o aumento maior da produtividade ficou por conta do arroz e feijão.
Entretanto, esta produtividade do arroz e do feijão tem passado despercebida, porque a mídia insiste em enaltecer os produtos do agronegócio, principalmente o volume da produção de soja (toneladas/ano), mas não esclarecem que o aumento da produtividade teve um acréscimo de apenas 6,77% de quilos por hectare em 2006, comparado aos dados do Censo de 1995/96. Ou seja, a produtividade média da soja no Estado sai de 2.408 quilos por hectare em 1995/96 para 2.571 quilos por hectare em 2006.
Já o arroz registrou um aumento de produtividade de 67,77% em 2006, comparado com os dados do Censo de 1995/96, e o feijão aumentou a produtividade em 51,19% em relação ao mesmo período. Deve-se a isso a não instalação de uma crise por desabastecimento do produto. Apesar de sofrer uma redução de área colhida em 2006, o volume da produção foi superior ao de 1995/96. Outro dado importante a ressaltar refere-se a classe de área responsável pela produção de feijão, que é a pequena unidade com até 200 há. Este estrato responde por 64,07% do total da produção. Ou seja, apesar de pequena, estes estabelecimentos têm conseguido se apropriar dos avanços tecnológicos e melhorar sua eficiência produtiva.
Perante a situação atual de ofensiva gigantesca do Agronegócio no Mato Grosso do Sul, qual deveria ser o programa político da classe camponesa no Estado na sua luta pela reforma agrária?
Primeiramente, é preciso afirmar a necessidade de respeito à Reforma Agrária em curso neste Estado. É preciso respeitar a batalha cotidiana destes homens e mulheres, mesmo quando ela se parece com uma luta de Davi e Golias. Porque são estas lutas que abrem espaços que servem de referência concreta da existência de um modo de vida, cujo centro não é a terra mercadoria, mas a terra como vida e trabalho.
Todavia, no plano estrutural, é preciso entender que a Reforma Agrária existe na Lei; porém, o Estado brasileiro tem se comportado, na maioria das vezes, como adversário da Reforma Agrária. É possível encontrarmos nas instituições que executam a Reforma Agrária – em todas as esferas de poder – funcionários que não acreditam na potencialidade econômica e social da Reforma Agrária.
Mas, como isso é possível acontecer?
É possível porque no Brasil a luta pela/na terra tem caráter permanente. Isso ocorre porque não se trata de uma questão técnica – como, onde, o quê produzir? A Reforma Agrária é uma questão política, é um embate entre os que têm muita terra e poder e os sem-terra ou com pouca terra. Consequentemente, nossa Reforma Agrária é de longo curso marcada pela descontinuidade.
Logo, a experiência exitosa dos assentamentos – e há muitas – está mais ligada à organização dos movimentos sociais na luta permanente do que a política de Estado. O resultado desta luta é a diferenciação dos assentamentos no Brasil. Isto significa dizer que a viabilidade ou inviabilidade destes depende diretamente do poder de luta dos sujeitos. Aqueles com maior autonomia e qualidade de vida são também os que perceberam que só virá do Estado aquilo que conquistarem. Isso tem incluído bloquear rodovias, ocupar prédios públicos, ocupar propriedades rurais.
Situação que aponta para a fragilidade da Lei de Reforma Agrária como política de Estado. Dito de outra forma, a escolha entre autonomia ou dependência dos assentamentos está ligada à capacidade de luta por saúde, educação, crédito, estradas, etc. Logo, urge a necessidade do debate da Reforma Agrária, no sentido de que ela assuma, de vez, seu papel de distribuição de renda e ressocialização dos sujeitos.
Por exemplo, defendo uma política de assentamentos concentrada, ou seja, é preciso escolher uma microrregião e nela distribuir os assentamentos. Esta ação gerará desdobramentos territoriais no campo e na cidade, a comprovar que a agricultura camponesa é superior ao agronegócio em geração de renda e emprego. Claro, dentro de um modelo próprio do modo de vida destas pequenas unidades. Quero, com isso, marcar distância em relação à Reforma Agrária economicista, que quer transformar os assentados em pequenos empresários, como recentemente aconteceu com o projeto Itamaraty.
Outra questão fundamental, na luta pela Reforma Agrária, é exorcizar a idéia de que toda grande propriedade é sinônima de agronegócio. Este pensamento não procede no Brasil e muito menos no MS. É preciso dizer que apenas uma parte da grande propriedade se modernizou; por isso a luta encarniçada contra a revisão dos índices de produtividade. Os dados do INCRA disponíveis revelam que há muita terra improdutiva e com indícios de grilagem no MS. A Reforma Agrária não pode abandonar este mote em nome da luta contra a falta de limite do agronegócio; na verdade é preciso caminhar nos dois eixos.
Segundo a professora, o agronegócio mudou a paisagem, o território e a cultura no campo e do campesinato. Diante das culturas da soja, cana e eucalipto, quais são as chances de sobrevivência da agricultura familiar no MS?
A complexidade da expansão do agronegócio tem revelado que neste século XXI, a luta transcende a terra. É uma luta por terra e território. Pois, a terra, em disputa, revela sua condição de território como portador de recursos naturais e matérias-primas indispensáveis à expansão do agronegócio. É por isso que muitos pesquisadores já usam o termo agrohidronegócio, quando estudam a expansão desta atividade empresarial no campo.
Para entender os conflitos gerados pela expansão do agrohidronegócio no MS, é necessário considerar que sua principal estratégia tem sido a territorialização. Ocorre territorialização do capital no campo mediante a aliança de classes entre capital industrial, capital financeiro e proprietário fundiário, momento em que eles se tornam um só agente do capital, formando um “complexo territorial”. Situação que tem sido comum no setor sucroalcooleiro e de celulose e papel, embora não limitado a eles. Este processo de territorialização do agronegócio é muito perverso, porque é concentrador de terra e capital. Dele resulta um território em disputa, uma vez que a territorialização deste complexo é sempre expropriação do trabalho familiar camponês. Entender a estruturação deste processo, em especial o papel do Estado via instituições de pesquisa, assistência e financiamento, se torna premissa para desvendar as tramas do agronegócio no sentido de compreender suas manifestações futuras e as possibilidades de resistência. Digo que o MS tem se caracterizado como área preferencial de investimento deste “Complexo Territorial”, porque o Estado (nas três esferas) tem ordenado o território por meio de incentivos, isenções, flexibilização ambiental. Este ordenamento territorial permite uma acumulação de capital acelerada, exemplo é a eucaliptização da região Leste. Em três anos, a Fibria (antiga VCP) dobrou a área plantada e montou um complexo celulose-papel, que faz com que, do total produzido pela empresa, Três Lagoas já responda por ¼ da produção de celulose de mercado (1,3 milhão Ton/Ano).
Porém, se por um lado é preciso indicar a existência concreta de expansão do capital industrial no campo, por outro é fundamental pensar a escala de alternativas.
Digo isso porque não concordo com aqueles que acreditam que terminaremos em um mar de “cana”, “eucalipto”, que não existe possibilidade de outras formas sociais no campo. Acredito que este processo de expansão do agronegócio no campo caminha, contraditoriamente, com outras formas sociais, em especial a agricultura familiar camponesa.
Isso ocorre em virtude do desenvolvimento do capital se alimentar da multiplicidade das formas sociais; segundo, porque a ausência do camponês no território não significa ausência do conflito. Evidência disso é que o movimento hegemônico de luta pela terra no Brasil, representado pelo MST, é formado por sem-terra, ou seja, a resistência se deu no período ápice da Revolução Verde, quando o trabalhador familiar foi varrido do campo.
Uma informação importante da realidade, que corrobora no sentido de evidenciar a resistência, são os dados do Censo agropecuário de 2006 do MS. Eles registram um aumento significativo quanto ao número de estabelecimentos nas classes de área de até menos 10 hectares (46,09%) e de até menos 50 hectares (84,60%), enquanto que para as demais classificações de área, ocorreu uma pequena redução comparada com os dados coletados pelo Censo de 1995/96.
No entanto, este fato ainda não representa em si uma desconcentração fundiária no MS, apesar do crescimento dos pequenos extratos de área, porque a área ocupada por eles é muito pequena. Ou seja, as classes de área de menos 10 e de menos 50 hectares que em 1995/96, juntas, detinham 1,21% da área total, passam a ocupar 2,09% da área total no Estado, em 2006. Por sua vez, os estabelecimentos de acima de 1000 hectares que em 1995/96 açambarcavam 78,44% do território sul-mato-grossense, reduzem seu domínio territorial em 1,51% segundo dados do censo de 2006. Ou seja, detém agora 76,93% da área total do Estado.
Por outro lado, mesmo sem desconcentrar o aumento destes pequenos estabelecimentos, impactou a estrutura. Neste sentido, o número de estabelecimentos passou de 49.423 no Censo 1995/6 para 64.862 no Censo 2006.
Destacamos que mesmo que o aumento do número de estabelecimentos com menos de 50 ha não tenha sido suficiente para gerar desconcentração fundiária, há um saldo positivo no fato de que novas famílias estão vivendo e trabalhando no campo, conseqüência em grande parte da luta dos movimentos sociais pela Reforma Agrária.
Obviamente que é preciso discutir as condições desta sobrevivência da agricultura familiar no MS. Logo, é preciso romper o circuito de miserabilidade que os donos da terra e do capital tem imposto. Neste sentido abrem-se algumas frentes de luta na busca por terra como justiça social e dignidade, como: Revisão dos Índices de Produtividade; Aplicação Efetiva da Municipalização do ITR; Campanha pelo limite de Propriedade e do Plantio da Cana e Eucalipto; Campanha Nacional em Defesa da Agricultura Familiar Camponesa como política pública.
Segundo seu critério, quais deveriam ser os alicerces de uma campanha de defesa da Agricultura Familiar Camponesa?
Em relação à Campanha Nacional em Defesa da Agricultura Familiar, é certamente a ação mais importante pós-eleição de Dilma, inclusive para pagar a dívida com os camponeses que o governo Lula deixou. Penso que o conteúdo central desta Campanha é aquilo que a Cartilha da Agricultura Familiar, organizada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário/MDA, mostrou: a potencialidade de produção e geração de renda que possuem os estabelecimentos até quatro módulos fiscais. Porém, isso ainda não é suficiente. É preciso uma Campanha que estimule a transição da agricultura convencional para a agro ecológica e, neste caso, mais uma vez os camponeses são o público ideal. O que eu estou pensando?
Defendo uma Campanha pelo subsídio estatal para produção de alimentos de consumo popular até quatro módulos fiscais (pequena propriedade), como os países centrais fazem há muito tempo. E este estímulo do subsídio deve estar atrelado à construção de um novo modelo de agricultura no Brasil, a agroecológica, que é generosa com os alimentos e com a natureza. Desta forma, a Campanha terá aceitação da população, até porque a transição requer amplo investimento a curto e médio prazos. E aqueles que quiserem continuar no modelo convencional, continuariam, mas sem esta vantagem creditícia. Portanto, temos que pensar a realidade, seus desdobramentos e as alternativas.
No caso particular do MS, não adianta desconsiderar a territorialização do agronegócio ou considerá-la um fim em si mesmo. Insisto que é preciso considerar este fenômeno para partimos em busca de diálogo no sentido de pensar quem está sendo impactado no tempo e no espaço. Monitorarmos, por exemplo, a área plantada com monocultura por município, os impactos sobre a fauna, flora e os recursos hídricos, bem como os conflitos gerados.
Discordo daqueles que defendem a eucaliptização da região Leste do MS tendo como pressuposto o fato de que o que se tinha antes eram desemprego e terra degradada pela pecuária. A mesma lógica explicativa aplicada também para o caso da expansão da cana. Ora, é preciso uma escala de alternativas cujo centro de referência não seja o pior. E neste debate, a Universidade tem o dever de contribuir como fórum de discussão de idéias, pois as alterações no ambiente vivido são imensas como conseqüência deste “Complexo Territorial”.
Comissão Pastoral da Terra
Mato Grosso do Sul
Uma pesquisa realizada pela doutora Rosemeire Aparecida de Almeida, docente da graduação e pós graduação em geografia da UFMS/Campus de Três Lagoas, revela dados que colocam em xeque a suposta maravilha do agronegócio em Mato Grosso do Sul. A pesquisadora demonstra com clareza, números e porcentagens as flagrantes contradições que o mesmo possui; e questiona a suposta capacidade do agronegócio em relação à produtividade e geração de ocupações no campo. E ainda desnuda sua total ineficiência no uso do expressivo volume de recursos que recebe do Estado em financiamento. O setor, que recheia na mídia propagandas de eficiência, perde em eficácia para a pequena unidade de produção que multiplicou por 20 o que recebeu de financiamento, no período em que foi realizada a pesquisa, já o agronegócio dividiu por dois a “ajuda” recebida. A Comissão Pastoral da Terra, Regional Mato Grosso do Sul, conversou com a profissional. Confira abaixo a entrevista:
A professora é do conceito de que o Agronegócio, sobretudo aqui no Mato Grosso do Sul, é incompetente, segundo uma pesquisa sua. Pode citar os elementos principais em que se baseia para sustentar isso?
Recentemente, coordenei pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul/UFMS, com recursos do CNPq e Fundect/MS, pesquisa referente a análise e comparação das transformações territoriais nos Estados de Mato Grosso do Sul e Paraná por meio do estudo dos Censos Agropecuários do IBGE (1995/96 e 2006).
O estudo comparativo destes Estados se justifica pela reconhecida diferença agrária existente em termos de malha fundiária, utilização das terras, mudanças tecnológicas, geração de emprego e renda.
De forma geral, a análise das amostras confirma as hipóteses de que a desconcentração da propriedade é motor de dinamismo no espaço rural e urbano, expresso na maior capacidade de geração de riquezas e pessoal ocupado.
Por exemplo, destacamos que apesar do rebanho bovino do Norte Central paranaense ser cinco vezes menor em relação à região Leste de Mato Grosso do Sul, a quantidade produzida de leite é superior. No entanto, uma simetria permanece, qual seja: nas duas regiões é a pequena unidade que responde pela maior produção de leite. Na região Leste, 42,68% do leite produzido provém dos estabelecimentos de menos de 100 ha e 76,93%, na região Norte Central paranaense.
A respeito dos valores da produção, verificamos que na região Leste do MS as classes de área de menos de 50 hectares foram responsáveis por 5,89% do valor total produzido; já a classe de área com mais de 1000 hectares, por 71,98%.
Porém, ao cruzar estes dados com o valor dos financiamentos obtidos, observamos que a eficiência da pequena unidade é maior. Dito de outra forma, a classe de área de mais de 1000 hectares obteve financiamento de mais de 1 bilhão de reais e gerou um valor de produção total de 524 milhões; a pequena unidade de produção de menos de 50 ha acessou 2,4 milhões (0,21% do valor total dos financiamentos obtidos) e gerou um valor de produção total de 42,9 milhões.
Ou seja, a classe de área de menos de 50 hectares multiplicou por 20 o valor do financiamento e a grande dividiu por dois o valor do financiamento. Portanto, a grande unidade de produção produziu metade do valor que tomou de recursos públicos.
Temos informações importantes também para o Estado na leitura dos dados dos dois últimos censos agropecuários (1995/96 e 2006). A partir da comparação de quatro produtos da lavoura temporária, sendo dois que fazem parte principalmente da agricultura de exportação, e dois que são componentes principais do consumo popular dos brasileiros, em que verificamos que o aumento maior da produtividade ficou por conta do arroz e feijão.
Entretanto, esta produtividade do arroz e do feijão tem passado despercebida, porque a mídia insiste em enaltecer os produtos do agronegócio, principalmente o volume da produção de soja (toneladas/ano), mas não esclarecem que o aumento da produtividade teve um acréscimo de apenas 6,77% de quilos por hectare em 2006, comparado aos dados do Censo de 1995/96. Ou seja, a produtividade média da soja no Estado sai de 2.408 quilos por hectare em 1995/96 para 2.571 quilos por hectare em 2006.
Já o arroz registrou um aumento de produtividade de 67,77% em 2006, comparado com os dados do Censo de 1995/96, e o feijão aumentou a produtividade em 51,19% em relação ao mesmo período. Deve-se a isso a não instalação de uma crise por desabastecimento do produto. Apesar de sofrer uma redução de área colhida em 2006, o volume da produção foi superior ao de 1995/96. Outro dado importante a ressaltar refere-se a classe de área responsável pela produção de feijão, que é a pequena unidade com até 200 há. Este estrato responde por 64,07% do total da produção. Ou seja, apesar de pequena, estes estabelecimentos têm conseguido se apropriar dos avanços tecnológicos e melhorar sua eficiência produtiva.
Perante a situação atual de ofensiva gigantesca do Agronegócio no Mato Grosso do Sul, qual deveria ser o programa político da classe camponesa no Estado na sua luta pela reforma agrária?
Primeiramente, é preciso afirmar a necessidade de respeito à Reforma Agrária em curso neste Estado. É preciso respeitar a batalha cotidiana destes homens e mulheres, mesmo quando ela se parece com uma luta de Davi e Golias. Porque são estas lutas que abrem espaços que servem de referência concreta da existência de um modo de vida, cujo centro não é a terra mercadoria, mas a terra como vida e trabalho.
Todavia, no plano estrutural, é preciso entender que a Reforma Agrária existe na Lei; porém, o Estado brasileiro tem se comportado, na maioria das vezes, como adversário da Reforma Agrária. É possível encontrarmos nas instituições que executam a Reforma Agrária – em todas as esferas de poder – funcionários que não acreditam na potencialidade econômica e social da Reforma Agrária.
Mas, como isso é possível acontecer?
É possível porque no Brasil a luta pela/na terra tem caráter permanente. Isso ocorre porque não se trata de uma questão técnica – como, onde, o quê produzir? A Reforma Agrária é uma questão política, é um embate entre os que têm muita terra e poder e os sem-terra ou com pouca terra. Consequentemente, nossa Reforma Agrária é de longo curso marcada pela descontinuidade.
Logo, a experiência exitosa dos assentamentos – e há muitas – está mais ligada à organização dos movimentos sociais na luta permanente do que a política de Estado. O resultado desta luta é a diferenciação dos assentamentos no Brasil. Isto significa dizer que a viabilidade ou inviabilidade destes depende diretamente do poder de luta dos sujeitos. Aqueles com maior autonomia e qualidade de vida são também os que perceberam que só virá do Estado aquilo que conquistarem. Isso tem incluído bloquear rodovias, ocupar prédios públicos, ocupar propriedades rurais.
Situação que aponta para a fragilidade da Lei de Reforma Agrária como política de Estado. Dito de outra forma, a escolha entre autonomia ou dependência dos assentamentos está ligada à capacidade de luta por saúde, educação, crédito, estradas, etc. Logo, urge a necessidade do debate da Reforma Agrária, no sentido de que ela assuma, de vez, seu papel de distribuição de renda e ressocialização dos sujeitos.
Por exemplo, defendo uma política de assentamentos concentrada, ou seja, é preciso escolher uma microrregião e nela distribuir os assentamentos. Esta ação gerará desdobramentos territoriais no campo e na cidade, a comprovar que a agricultura camponesa é superior ao agronegócio em geração de renda e emprego. Claro, dentro de um modelo próprio do modo de vida destas pequenas unidades. Quero, com isso, marcar distância em relação à Reforma Agrária economicista, que quer transformar os assentados em pequenos empresários, como recentemente aconteceu com o projeto Itamaraty.
Outra questão fundamental, na luta pela Reforma Agrária, é exorcizar a idéia de que toda grande propriedade é sinônima de agronegócio. Este pensamento não procede no Brasil e muito menos no MS. É preciso dizer que apenas uma parte da grande propriedade se modernizou; por isso a luta encarniçada contra a revisão dos índices de produtividade. Os dados do INCRA disponíveis revelam que há muita terra improdutiva e com indícios de grilagem no MS. A Reforma Agrária não pode abandonar este mote em nome da luta contra a falta de limite do agronegócio; na verdade é preciso caminhar nos dois eixos.
Segundo a professora, o agronegócio mudou a paisagem, o território e a cultura no campo e do campesinato. Diante das culturas da soja, cana e eucalipto, quais são as chances de sobrevivência da agricultura familiar no MS?
A complexidade da expansão do agronegócio tem revelado que neste século XXI, a luta transcende a terra. É uma luta por terra e território. Pois, a terra, em disputa, revela sua condição de território como portador de recursos naturais e matérias-primas indispensáveis à expansão do agronegócio. É por isso que muitos pesquisadores já usam o termo agrohidronegócio, quando estudam a expansão desta atividade empresarial no campo.
Para entender os conflitos gerados pela expansão do agrohidronegócio no MS, é necessário considerar que sua principal estratégia tem sido a territorialização. Ocorre territorialização do capital no campo mediante a aliança de classes entre capital industrial, capital financeiro e proprietário fundiário, momento em que eles se tornam um só agente do capital, formando um “complexo territorial”. Situação que tem sido comum no setor sucroalcooleiro e de celulose e papel, embora não limitado a eles. Este processo de territorialização do agronegócio é muito perverso, porque é concentrador de terra e capital. Dele resulta um território em disputa, uma vez que a territorialização deste complexo é sempre expropriação do trabalho familiar camponês. Entender a estruturação deste processo, em especial o papel do Estado via instituições de pesquisa, assistência e financiamento, se torna premissa para desvendar as tramas do agronegócio no sentido de compreender suas manifestações futuras e as possibilidades de resistência. Digo que o MS tem se caracterizado como área preferencial de investimento deste “Complexo Territorial”, porque o Estado (nas três esferas) tem ordenado o território por meio de incentivos, isenções, flexibilização ambiental. Este ordenamento territorial permite uma acumulação de capital acelerada, exemplo é a eucaliptização da região Leste. Em três anos, a Fibria (antiga VCP) dobrou a área plantada e montou um complexo celulose-papel, que faz com que, do total produzido pela empresa, Três Lagoas já responda por ¼ da produção de celulose de mercado (1,3 milhão Ton/Ano).
Porém, se por um lado é preciso indicar a existência concreta de expansão do capital industrial no campo, por outro é fundamental pensar a escala de alternativas.
Digo isso porque não concordo com aqueles que acreditam que terminaremos em um mar de “cana”, “eucalipto”, que não existe possibilidade de outras formas sociais no campo. Acredito que este processo de expansão do agronegócio no campo caminha, contraditoriamente, com outras formas sociais, em especial a agricultura familiar camponesa.
Isso ocorre em virtude do desenvolvimento do capital se alimentar da multiplicidade das formas sociais; segundo, porque a ausência do camponês no território não significa ausência do conflito. Evidência disso é que o movimento hegemônico de luta pela terra no Brasil, representado pelo MST, é formado por sem-terra, ou seja, a resistência se deu no período ápice da Revolução Verde, quando o trabalhador familiar foi varrido do campo.
Uma informação importante da realidade, que corrobora no sentido de evidenciar a resistência, são os dados do Censo agropecuário de 2006 do MS. Eles registram um aumento significativo quanto ao número de estabelecimentos nas classes de área de até menos 10 hectares (46,09%) e de até menos 50 hectares (84,60%), enquanto que para as demais classificações de área, ocorreu uma pequena redução comparada com os dados coletados pelo Censo de 1995/96.
No entanto, este fato ainda não representa em si uma desconcentração fundiária no MS, apesar do crescimento dos pequenos extratos de área, porque a área ocupada por eles é muito pequena. Ou seja, as classes de área de menos 10 e de menos 50 hectares que em 1995/96, juntas, detinham 1,21% da área total, passam a ocupar 2,09% da área total no Estado, em 2006. Por sua vez, os estabelecimentos de acima de 1000 hectares que em 1995/96 açambarcavam 78,44% do território sul-mato-grossense, reduzem seu domínio territorial em 1,51% segundo dados do censo de 2006. Ou seja, detém agora 76,93% da área total do Estado.
Por outro lado, mesmo sem desconcentrar o aumento destes pequenos estabelecimentos, impactou a estrutura. Neste sentido, o número de estabelecimentos passou de 49.423 no Censo 1995/6 para 64.862 no Censo 2006.
Destacamos que mesmo que o aumento do número de estabelecimentos com menos de 50 ha não tenha sido suficiente para gerar desconcentração fundiária, há um saldo positivo no fato de que novas famílias estão vivendo e trabalhando no campo, conseqüência em grande parte da luta dos movimentos sociais pela Reforma Agrária.
Obviamente que é preciso discutir as condições desta sobrevivência da agricultura familiar no MS. Logo, é preciso romper o circuito de miserabilidade que os donos da terra e do capital tem imposto. Neste sentido abrem-se algumas frentes de luta na busca por terra como justiça social e dignidade, como: Revisão dos Índices de Produtividade; Aplicação Efetiva da Municipalização do ITR; Campanha pelo limite de Propriedade e do Plantio da Cana e Eucalipto; Campanha Nacional em Defesa da Agricultura Familiar Camponesa como política pública.
Segundo seu critério, quais deveriam ser os alicerces de uma campanha de defesa da Agricultura Familiar Camponesa?
Em relação à Campanha Nacional em Defesa da Agricultura Familiar, é certamente a ação mais importante pós-eleição de Dilma, inclusive para pagar a dívida com os camponeses que o governo Lula deixou. Penso que o conteúdo central desta Campanha é aquilo que a Cartilha da Agricultura Familiar, organizada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário/MDA, mostrou: a potencialidade de produção e geração de renda que possuem os estabelecimentos até quatro módulos fiscais. Porém, isso ainda não é suficiente. É preciso uma Campanha que estimule a transição da agricultura convencional para a agro ecológica e, neste caso, mais uma vez os camponeses são o público ideal. O que eu estou pensando?
Defendo uma Campanha pelo subsídio estatal para produção de alimentos de consumo popular até quatro módulos fiscais (pequena propriedade), como os países centrais fazem há muito tempo. E este estímulo do subsídio deve estar atrelado à construção de um novo modelo de agricultura no Brasil, a agroecológica, que é generosa com os alimentos e com a natureza. Desta forma, a Campanha terá aceitação da população, até porque a transição requer amplo investimento a curto e médio prazos. E aqueles que quiserem continuar no modelo convencional, continuariam, mas sem esta vantagem creditícia. Portanto, temos que pensar a realidade, seus desdobramentos e as alternativas.
No caso particular do MS, não adianta desconsiderar a territorialização do agronegócio ou considerá-la um fim em si mesmo. Insisto que é preciso considerar este fenômeno para partimos em busca de diálogo no sentido de pensar quem está sendo impactado no tempo e no espaço. Monitorarmos, por exemplo, a área plantada com monocultura por município, os impactos sobre a fauna, flora e os recursos hídricos, bem como os conflitos gerados.
Discordo daqueles que defendem a eucaliptização da região Leste do MS tendo como pressuposto o fato de que o que se tinha antes eram desemprego e terra degradada pela pecuária. A mesma lógica explicativa aplicada também para o caso da expansão da cana. Ora, é preciso uma escala de alternativas cujo centro de referência não seja o pior. E neste debate, a Universidade tem o dever de contribuir como fórum de discussão de idéias, pois as alterações no ambiente vivido são imensas como conseqüência deste “Complexo Territorial”.
Assinar:
Postagens (Atom)